Monday, April 30, 2007

1º de Maio de 1973 - o último sem liberdade

(José Dias Coelho, 1961)


Ler aqui, num outro blogue.

Precários de todo o mundo, rebelai-vos!


Amanhã, no Dia Mundial (excepto nos EUA) do Trabalhador, vamos ver os precários (bolseiros de investigação científica incluídos) a manifestarem-se em Lisboa. Eu estarei lá.

33 anos - Abril sempre


Bolo de comemoração dos 33 anos da Revolução dos Cravos, Arraial do 25 de Abril, Largo do Carmo, Lisboa, 2007

Sunday, April 29, 2007

Blitzkrieg! Fehlschlag! Remis!


Assisti ao jogo na página de live betting (que não linko devido ao nevoeiro jurídico que creio ainda pairar sobre a coisa em Portugal) de uma certa agência de apostas com base em Gibraltar, retransmitido, salvo erro, através de um servidor em Hong-Kong, mostrado num ecrãzinho apenas ligeiramente maior que o mostrador do meu relógio de pulso, (que é de fabrico italiano, não que isso venha agora ao caso) e, não sei por que carga de água, narrado em alemão (o jogo, não o relógio, que é tão mudo como Lavinia, e por motivos muito semelhantes).
O mundo, como saberá o caro leitor, divide-se entre os que colocam o seu optimismo em cheque, e os que lhe passam cheques em branco. As perspectivas eram optimistas: se acoplei 10 das minhas suadas libras a uma vitória do Sporting por mais de 3 golos de diferença, fi-lo apenas porque a aposta se me afigurou inteiramente razoável quando confirmei os onzes iniciais (introduzidos pelo rapaz alemão, já agora, com o que me pareceu ser uma série de referências esotéricas ao John Allegro, aquele senhor que achava que Jesus Cristo era um cogumelo, mas o meu domínio da língua é quase inexistente, e posso ter percebido mal). O Benfica jogou em 1-2-1-1-3-1-1, a saber: um líbero clássico maquiavelicamente disfarçado de lateral-esquerdo (Leo), dois serventes de pedreiro (Anderson e David Luiz), um supervisor de serventes de pedreiro (Petit), uma enigmática dor de cabeça (Nélson), três jogadores de futebol (Rui Costa, Karagounis e Mirohito), um interessante estivador não-ortodoxo (Katsouranis) e uma vítima de voodoo (Nancy Gomes). Do outro lado, estavam 9 jogadores de campo, mais o Abel.
O que a História nos ensina sobre estes jogos não tem nada a ver com aquele soundbite estafado de que "ganha sempre a equipa em pior momento". Se isto fosse verdade, o Sporting raramente perderia um derby. A verdade resume-se antes em dois pontos de fácil assimilação: 1) o Sporting só ganha na Luz quando não precisa de ganhar na Luz. 2) Deus não me grama.
A primeira parte foi jogada apenas por uma equipa, e apenas numa metade do relvado, com interlúdios. Um oportuno rebuffering condenou-me a seguir os minutos iniciais somente pelo comentário áudio do rapaz alemão, que deu a ideia de ter gostado imenso do flugkopfball do Liedson, e que aproveitava todas as oportunidades para pronunciar o seu nome em estéreo (Lídzon, Lídzon). O regresso das imagens comprovou alguns sinais preocupantes, como a arcaica tradição de 90% dos ressaltos caírem para jogadores do Benfica, independentemente de estes estarem a ser rotineiramente esmagados em todas as outras vertentes do jogo. O meu amigo Paulinho, que tirou um curso nessa inimpugnável instituição que é o ISCAL, provou estatisticamente que o Benfica ganha mais bolas divididas do que todos os outros clubes do mundo em conjunto, e eu não duvido por um segundo que seja das suas conclusões.
O rapaz alemão, entretando, tinha alterado o seu foco, e mostrava alguma incredulidade com o facto de o João Moutinho ter escolhido este jogo específico para mostrar aos olheiros europeus que também sabe falhar passes. Isto, esclareço, é uma mera inferência, não apoiada por imagens, pois o ecrãzinho estava outra vez em branco.
Depois de quinze segundos de impecável transmissão, seguiram-se mais duas prolongadas quedas do servidor, uma delas, como é natural, no preciso minuto em que o Mirohito empatou, lance que o nosso teutónico amigo celebrou efusivamente, gritando o nome de vários filósofos.
A segunda parte começou com o som inconfundível da minha vida a andar para trás.
Abel, depois do erro inicial que foi o cruzamento para Lídzon Lídzon, e para alívio generalizado, reverteu ao que melhor sabe: falhar einwurfs em série. Até o rapaz alemão parecia resignado. Lin-kisch ein-wurf, gemia ele repetidamente, perante a minha louvável renitência em dizer palavrões. Rodrigo Tello, um jogador que aprendi a amar, um pouco como aprendemos a amar aqueles cães muito estúpidos que mijam constantemente o chão todo, que nunca devolvem o osso, mas que dominam na perfeição um dos truques básicos, conseguiu a proeza de cruzar a bola três ou quatro vezes para o ÚNICO local da área onde esta poderia concebivelmente ser despachada pelos estrábicos centrais benfiquistas.
A bola, já que falamos nela, insistia em permanecer do mesmo lado a que tinha sido habituada na primeira parte, alheia ao pormenor de os melhores jogadores estarem agora do outro lado. O servidor sussurrava-me promessas lânguidas de permanência e constância, mas voltou a ir abaixo. A vinte segundos de black-out sucederam-se dois cantos consecutivos para as mãos peçonhentas do Quim (um nome impronunciável para alemães, para ingleses, para seres civilizados, para marcianos). Nas bancadas da luz, os observadores estrangeiros escrevinhavam notas frenéticas sobre Nani, que continua a abdicar da possa da bola com uma classe sem paralelos na História recente. Mais ou menos na altura em que Anderson decidiu praticar amor livre com Polga dentro da grande área, fui abrir uma janela e dizer a Birmingham o que pensava sobre as coisas em geral. O meu vizinho Fortunato ("call me Fred!") estava na varanda, a fumar o que apenas posso descrever como um cigarro.
Quando voltei à base, o rapaz alemão, nesta altura audivelmente preocupadíssimo com o verletzung do Ricardo, achou por bem introduzir uma nota ligeira na noite tépida, lembrando-nos que o Benfica e o Sporting são ambos de Lissabon, o que esclareceu todos aqueles que julgavam que o jogo estava a decorrer em Castelo de Videsburg.
Os treinadores fizeram as substituições que se impunham, e o estóico comentador alemão saiu ileso das suas tentativas de pronunciar o nome de Pereirinha.
O schiedsrichter apitou. O dinheiro não voltou. Os adeptos do Sporting, inexplicavelmente, aplaudiram.
Parabéns ao Porto.

Uma história exemplar


Passei os últimos dias em Lanzarote, nas Canárias, percorrendo e fotografando as suas espantosas paisagens vulcânicas mas a história, que não resisto a contar, pouco ou nada tem a ver com as belezas naturais.

Dois dias depois do 25 de Abril assisti, na TVE, a um debate político com a intervenção de vários comentadores encartados. O pretexto era um livro, publicado por um dos presentes, que trata do fim do franquismo.

Falou-se muito acerca da transição para a democracia em Espanha e discorreu-se sobre se a democracia tinha sido realmente conquistada ou se tinha antes sido oferecida, de bandeja, pelos políticos ao povo.

Referiram-se as vários influências estrangeiras, ou tentativas de ingerência, sendo específicamente mencionados os Estados Unidos e a França.

Concluiu-se que a experiência espanhola de transição pacífica foi um grande sucesso, exemplo para todo o mundo.

Por incrível que pareça, e parece ainda mais no dia 27 de Abril, a Revolução do 25 de Abril e o nome do nosso país nunca foram sequer mencionados.

Dispenso-me de tergiversar sobre o significado desta história...

Saturday, April 28, 2007

Há coisas que têm simplesmente de ser partilhadas com o Tiago Cavaco

«Revista Atlântico» é um anagrama de «Teatro Calvinista».

Papa was a Rodeo - versão corrigida

I like your twisted point of view, Mike
I like your questioning eyebrows
You've made it pretty clear what you like
It's only fair to tell you now

that I leave early in the morning
and I won't be back till next year
I see that kiss-me pucker forming
but maybe you should plug it with a beer, cause

Papa was a rodeo - Mama was a rock'n'roll band
I could play guitar and rope a steer before I learned to stand
Home was anywhere with diesel gas - Love was a trucker's hand
Never stuck around long enough for a one night stand
Before you kiss me you should know
Papa was a rodeo

The light reflecting off the mirror ball
looks like a thousand swirling eyes
They make me think I shouldn't be here at all
You know, every minute, according to the United Nations' annual worldwide mortality statistics, at least ninety six people die

What are we doing in this dive bar
How can you live in a place like this
Why don't you just get into my car
and I'll take you away I'll take that kiss now, but

(boy) Papa was a rodeo...

And now it's 55 years later
We've had the romance of the century
After all these years wrestling gators
I still feel like crying when I think of what you said to me

Papa was a rodeo...

Before you kiss me you should know - Papa was a rodeo
What a coincidence, your Papa was a rodeo too

(Magnetic Fields feat. United Nations, «Papa was a Rodeo»)

Métrica

A história dos biliões de anos-luz da Katie Melua, desencantada pelo Doninhas do Sol, é a melhor dentro do género (e é de um género que se trata) desde a bochechuda proposta de correcção ao poema de Tennyson 'The Vision of Sin', feita por Charles Babbage. O poema inclui o seguinte dístico: Every minute dies a man/ Every minute one is born; que por sua vez teria alegadamente inspirado a seguinte missiva de Babbage: «I need hardly point out to you that this calculation would tend to keep the sum total of the world's population in a state of perpetual equipoise, whereas it is a well-known fact that the said sum total is constantly on the increase. I would therefore take the liberty of suggesting that in the next edition of your excellent poem the erroneous calculation to which I refer should be corrected as follows: Every minute dies a man,/ And one and a sixteenth is born.
I may add that the exact figures are 1.167, but something must, of course, be conceded to the laws of metre.»

(A biografia de Babbage - um daqueles ingleses descritos por Henry Adams como reféns da sua própria excentricidade - é fértil em pérolas, mas creio que esta história é apócrifa: todas as fontes que consultei a introduzem com um pouco convincente "it is said that..." E há ali qualquer coisa na matemática que me está a incomodar, mas não lhe consigo pôr o dedo: como é que 1.167 arredonda para um e um dezasseis avos? Não devia ser 1.0625? [suspiro] A professora Irene, que Deus a tenha, bem me tentou avisar: isso dos livros é muito bonito, mas se não sabemos também a tabuada arriscamo-nos a que o merceeiro nos aldrabe. Ou, no meu caso específico, o corrector de apostas, que já por duas vezes me tentou enrolar numa salsicha numérica a la Babbage. Meninos e meninas do meu país: estudem as fracções e façam os deveres. Que mais não seja para não ficarem à mercê de contabilistas de relva sem escrúpulos.)

Food in New York

Dois queridos amigos seguem esta semana para Nova Iorque e eu não quis deixar de lhes dar as minhas recomendações sobre os locais a visitar e os restaurantes onde comer.
Nova Iorque é a capital mundial da diversidade, e isso reflecte-se nos restaurantes. Dificilmente se encontram, no mesmo sítio, tantas cozinhas juntas de origens tão diferentes, reflectindo bem o que é a cidade. Mas a oferta é tanta que é difícil fazer as melhores escolhas, principalmente se não se conhece a cidade e se tem um número limitado de dias.
Para encontrar um bom restaurante em Nova Iorque eu seguia as recomendações da Time Out New York (da revista semanal, quando a lia, mas especialmente do guia de estudantes) e de uma página especializada, o Citysearch. Nunca me arrependi. Segue-se uma lista de alguns dos meus restaurantes preferidos na cidade. Relativamente baratos e bons, com ligações para o Citysearch.

Almoço

No coração de Chinatown, o meu restaurante chinês favorito no mundo inteiro: o New Chao Chow. às vezes pode demorar a conseguir uma mesa (por isso é melhor ao alomço), mas o mercado funciona. Tanta procura significa que o sítio é mesmo muito bom.

Na Amsterdam Avenue há diversos restaurantes hispânicos, ou latinos (da América do Sul) que vale a pena tentar (um deles é o Flor de Mayo mas há outros). Podem comer-se iguarias cubanas como Ropa Vieja e a autêntica banana frita, que deve ser confeccionada com bananas gigantes ("plátanos" em espanhol) às rodelas.

Perto da belíssima Universidade de Columbia, e da Catedral St. John The Divine, o mítico Tom's Restaurant, da série Seinfeld e da canção de Suzanne Vega. Um must para os amantes da cidade e da sua cultura popular. Comida americana caseira - um diner típico. Servem bom peixe grelhado (quando têm).

Jantar

Em Chelsea, um dos mais autênticos restaurantes italianos, o Pepe Giallo. Excelentes pastas e pratos de carne. No diet coke, no skimmed milk, only good food é o lema. É o único sítio nos EUA que eu conheço que serve café Segafredo.

Outra vez perto da Universidade de Columbia, o Symposium. Comida grega excelente. Decoração magnífica, com um pátio nas traseiras com um jardim (algo que nem todos os clientes conhecem, mas que eu recomendo para tomar a refeição).

Perto da Union Square, o Chat 'n' Chew. Comida americana do sul (autêntica, muito boa - recomendo vivamente a jambalaya e o honey roasted chicken).

Bom apetite, e espero que não se queixem da comida americana!

Friday, April 27, 2007

A Dia D e o pluralismo da imprensa

Em Agosto do ano passado, publiquei aqui dois textos (que deram muita polémica) onde denunciava o carácter parcial e propagandístico do então suplemento semanal do Público “DiaD”, pelo menos no que à opinião publicada dizia respeito. Esses textos deram azo às mais indignadas reacções, mas nunca ninguém desmentiu as minhas afirmações. Nem podiam.
Um dos principais animadores da revista veio agora finalmente confirmar o que já sabíamos: a Dia D não era politicamente independente. Mesmo que indirectamente, e tantos meses depois (até a revista já acabou...), é bom vê-lo a reconhecer tal facto.

Problemas informáticos

Problemas com o computador com que geralmente trabalho têm-me impedido de actualizar o blogue. Espero ter o problema resolvido ainda hoje.

Mais uma manifestação de sectarismo do novo MRPP


Na manifestação popular do 25 de Abril, que decorreu na Av. da Liberdade, em Lisboa, quando a apresentadora chamava para o palco os representantes das diversas organizações que promoviam aquela manifestação, os rapazinhos da Juventude Comunista Portuguesa (JCP), facilmente identificáveis, porque eram os únicos que levavam as suas bandeiras partidárias desfraldadas, apuparam primeiro o representante da Juventude Socialista, depois o da Renovação Comunista (RC) e por último o Edmundo Pedro, do Partido Socialista (PS). Este acto, que pelo menos em relação à RC já se tinha registado em anos anteriores, dá bem a ideia de intolerância e incapacidade de conviver democraticamente com outras correntes políticas, principalmente se estas ousarem designar-se comunistas. Comunismo só há um, o do PCP e mais nenhum.
Mas se estas atitudes só comprometem aqueles que as assumem e neste caso era um grupo restrito de meninos identificados com a JCP, já as posições assumidas pelo PCP, JCP e grupos afins durante a preparação da manifestação revela uma total incapacidade de, neste momento, participarem em qualquer organização que se considere verdadeiramente unitária.
Assim, chamaria a atenção para que este ano foi impossível apresentar um manifesto comum às diferentes organizações promotoras da manifestação de apelo à participação na mesma. Tal como tem sucedido em anos anteriores o Eng. Aquilino Ribeiro Machado, com uma enorme paciência, apresentou mais uma vez um borrão à consideração de todos os representantes das organizações promotoras. O PCP e organizações afins, propuseram logo de início um conjunto tão grande de emendas que tornavam inviável a leitura daquele texto e a sua aceitação pelas outras organizações, fora da sua área de influência, com principal destaque para o Partido Socialista. É evidente que o PCP preferiu a não existência de um manifesto à apresentação do que tinha sido elaborado. Ninguém inviabilizou pequenas correcções, algumas propostas pelo próprio PCP, mas era impossível aceitar uma desvirtuação tão completa do texto inicial. É evidente que o que estava em causa desde o início era que o PCP e seus companheiros queriam, num texto que se queria sintético e curto, estar constantemente a sublinhar todas as garantias constitucionais relativamente aos direitos sociais. E ainda estávamos num dos primeiros parágrafos. Sabia-se que mais para diante eram apresentadas alterações muito mais significativas. Seria elucidativo apresentar a versão original e as alterações propostas, mas não as possuo.
Mas a manifestação mais evidente de sectarismo foi a que se verificou com a recusa do Ricardo Araújo Pereira (RAP), dos Gatos Fedorentos, para falar em nome das organizações juvenis. Não estive por dentro do processo de recusa, mas é evidente que, para quem acha que estas manifestações valem pelo impacto mediático que alcançam, era muito mais significativo ter o RAP a discursar, do que um jovem sindicalista, como era apresentado pela JCP, a falar, por muitas verdades que transmitisse sobre a actual situação laboral.
Veja-se esta pérola de alguém que aparece a defender a posição da JCP: “obviamente que com isto ganha principalmente o PS (que assim se safa de mais uma intervenção crítica e logo no 25 de Abril)”. Ou esta outra, ainda mais significativa: “o RAP não passou de um pretexto da JS e do BE para que não houvesse do palco do 25 de Abril em Lisboa um discurso feito por um jovem contra as políticas do governo. ... . Usaram indecentemente o nome de RAP para esconderem que o que NÃO queriam mesmo era um jovem a malhar no palco do 25 de Abril em Lisboa nas políticas do governo do PS.”
Perante afirmações deste tipo, mas que reflectem uma mentalidade, o que se pode acrescentar.
Como já tenho afirmado publicamente, neste momento a Direcção do PCP arrasta este para um caminho sectário e esquerdista, que a longo prazo o transformará num Partido marginal ao sistema político, com quem é impossível estabelecer qualquer compromisso político, tornando-o numa espécie de MRRP dos tempos actuais.
Esta prática, que em diversas alturas atacou o movimento comunista e que conduziu à célebre manifestação de sectarismo de Classe contra Classe do final dos anos 20 e início de 30 do século passado, foi responsável pela derrota do Partido Comunista Alemão (PCA) e pelo desarme da esquerda na resistência à ascensão do nazismo. Foi a época em que o PCA acusava os sociais-democratas de sociais-fascistas (socialistas nas palavras e fascistas nos actos). Mais tarde o MRRP serviu-se desta consigna para atacar o PCP.
Espero em artigo posterior dar conta deste desvio histórico do movimento comunista, que lamentavelmente tanto se assemelha com a actual deriva sectária e esquerdista da Direcção do PCP.

Wednesday, April 25, 2007

His collapsible bathtub

When, in July 1906, the Tsar unconstitutionally dissolved the Parliament, a number of its members, my father among them, held a rebellious session in Viborg and issued a manifesto that urged the people to resist the government. For this, more than a year and a half later, he was imprisioned. My father spent a restful, if somewhat lonesome, three months in solitary confinement, with his books, his collapsible bathtub, and his copy of J. P. Muller's manual of home gymnastics.

(V. Nabokov, Speak, Memory)

É preciso usar sempre dupla precaução com estes cavalos irlandeses

Até aos 11/12 anos dividia os feriados em dois tipos: aqueles em que recebia prenda, e os outros. Depois cresci, ganhando algumas noções, assimilando alguns fundamentos, passando a dividir os feriados em dois tipos: aqueles em que não tinha de ir à escola, e os outros. Até que um longo processo de amadurecimento físico e intelectual me transformou neste homenzinho que hoje vos escreve, e cheguei ao sistema que me parece mais apropriado, que é o de dividir os feriados em dois tipos: aqueles em que as pistas permanecem abertas e os outros. Estou portanto em condições de assegurar que entre as variadíssimas e benéficas conquistas de Abril não se conta a capacidade de influenciar provas de barreiras efectuadas três décadas mais tarde, no recinto de Worcester. O pobre cavalinho tinha o nome de Polonius, e to his own self was true, espatifando-se ao tentar ultrapassar a sétima sebe, deixando o caminho da vitória aberto ao jockey Howie Ephgrave, que, não contente com os desafios do dia-a-dia certamente colocados pelo diminutivo 'Howie', tem o hábito de se passear pelos hipódromos do Reino com um medúseo chapéu cor de alcachofra.

(A deriva deste blogue para o comentário político, tendo acontecido apenas na sub-cave do Blogger, poderá não ter sido aparente para mais ninguém, mas mergulhou o autor num charco de consternação, entretando drenado por uma implacável purga interna que eliminou todos os drafts sobre "actualidades". Para evitar vergonhas futuras, o Pastoral Portuguesa passará a aplicar a seguinte 'regra de polegar' a todos os posts em estado embrionário: se o assunto for comentado no Blasfémias num prazo útil de três dias, não será comentado aqui. O que pode levantar toda uma nova série de problemas. Nomeadamente se o João Miranda começar a ler Pynchon e a apostar nos cavalos.)

Houve aqui publicidade enganosa

Vou no quinto capítulo de Speak, Memory e ainda só li dois insultos ao charlatão de Viena.

Para que conste

Este blogue é bom.

Tuesday, April 24, 2007

Salazar e as eleições

Aproveito o dia de hoje para recordar um pouco de História que tem andado muito esquecida (ou não foi bem aprendida), com um texto de há um mês atrás, publicado na imprensa e em alguns blogues.

Agora que Salazar parece em vias de ganhar pela primeira vez uma "eleição", e logo contra o Afonso Henriques, convém lembrar como eram as votações quando ele era vivo.

No que diz respeito à aprovação da Constituição de 1933, foi simples. As abstenções contaram a favor. A maioria foi esmagadora. Os portugueses nem precisaram de sair de suas casas para exprimir a sua "vontade".

Nas eleições legislativas o método também era infalivel. Nas eleições de 1957, por exemplo, em Lisboa, na véspera da eleição, os responsáveis pelas mesas eleitorais foram chamados ao Governo Civil onde receberam a indicação do resultado da votação do dia seguinte com uma margem de erro de 2 %. Assim, na freguesia de São João da Pedreira o resultado devia ser 56 ou 57%.

No dia seguinte houve guarda republicanos que andaram pelas mesas de voto a levar pacotes de votos de "guardas que estavam de piquete", que foram metidos nas urnas pelos presidentes das mesas. Mas isto teve uma relativa pouca importância.

Perto do fim, depois de assegurada a ausência de testemunhas inconvenientes, os elementos das mesas multiplicaram o número total de eleitores por 0,57 e dividiram o resultado pelo número de páginas dos cadernos eleitorais. Tiveram, assim, o número de eleitores de cada página que "deviam votar".

Procederam, então, sem se preocupar em lançar votos nas urnas, à operação de "compor os cadernos eleitorais", descarregando conscenciosamente nos dois cadernos o conveniente número de eleitores que "tinham" votado. A operação foi acompanhada de comentários do tipo: " Este é comunista, mas desta vez vai votar no governo".

Depois, enviaram para o Governo Civil um documento a dizer: "Percentagem de eleitores: 57%." Mas não se ficaram por aqui: abriram as urnas, contaram os votos, e enviaram para o Governo Civil um outro documento a dizer." Percentagem real de eleitores, tantos por cento" .

No caso concreto de uma mesa, a percentagem real de eleitores, incluindo os votos dos "guardas de piquete" e 50 votos riscados foi de 28 %, mas os elementos da mesa enviaram um documento a dizer que a "percentagem real", era de 30 %. É provavel que, quando chegasse ao Salazar, esta percentagem já fosse um bocadito mais alta.

Fui testemunha parcial destes factos em 1957. Uma outra testemunha foi o escritor Luis Pacheco a quem envio, 50 anos depois, as minhas saudações e que devia ser agora ouvido. Como comentador da "eleição de Salazar" e porque pode confirmar factos importantes para esclarecer um país que, 30 anos depois do 25 de Abril, ainda está muito mal informado.

Que, ao falar nas eleições do "antigamente", ainda fala em chapeladas, como se a fraude "dos guardas que estavam de piquete" e de uns tantos legionários fosse a mais importante. Salazar era muito mais subtil. Quarenta anos depois de morto, ainda engana o país.

E não só. Quando em Novembro de 1957 cheguei a França vi que os jornais franceses analisavam a situação portuguesa a partir do resultado de 57% de votos obtidos pelo governo nas últimas eleições legislativas.

(António Brotas, 21/03/2007)

Hoje e Sempre!



Clique na fotografia e VEJA.

.

25 de Abril em Tenerife



Vou passar o 25 de Abril no meio do Atlântico, a visitar a montanha mais alta de Espanha, o El Teide.

Daqui vai um abraço para todos os amigos da Revoluçao (sem til, por defeito do teclado) e também esta "recordação".

Diz que é uma espécie de manifesto de esquerda

Correu a blogosfera um “manifesto das esquerdas por Israel”, tendo sido divulgado pelo meu muito prezado Tiago Barbosa Ribeiro. Fosse só mais um “manifesto por Israel”, e eu nem lhe prestaria atenção nenhuma. Mas sendo um manifesto “das esquerdas”, julgo que merece a nossa atenção.
Na origem do manifesto está a expulsão de um militante do Bloco Nacionalista Galego. O episódio foi-nos explicado pelo Tiago (sempre atento a estas questões) em termos algo vagos: a expulsão deveu-se a o ex-militante ser dirigente da Associação Galega de Amizade com Israel e “defender o estado de Israel” (defender como?). O que não explica muito, mas (sem querer julgar em definitivo um caso que não conheço) parece-me suficiente para eu não concordar com a sua expulsão, se pertencesse ao referido partido. É possível (e desejável) ser de esquerda e procurar a cooperação com sectores moderados de Israel, que existem, embora sejam escassos.
Mesmo assim, o referido manifesto não pode merecer a minha concordância. E porquê? Porque objectivamente é um manifesto de apoio a Israel e à sua política expansionista e colonialista. Um manifesto de esquerda em apoio a Israel poderia ter feito sentido noutras ocasiões, quando Israel era atacado e teve de se defender. Mas, na sequência da Guerra dos Seis Dias, Israel ocupou (e ocupa, até hoje) ilegalmente territórios que não são seus. Para além disso Israel controla todas as actividades económicas dos territórios palestinianos, cobrando impostos, comissões e portagens e mantendo monopólios no abastecimento. Israel não é um estado laico, não concedendo direitos de cidadania plena aos seus cidadãos não judeus. Israel é um estado colonialista, e é o estado que mais sistematicamente viola as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Por isso, não creio que um estado como Israel possa merecer mais apoio de quem se diz de esquerda que não seja simplesmente ao direito a defender-se dos ataques que recebe. É este, e só este, o apoio que eu dou a Israel. Mas não é essa a política externa de Israel, que está muito longe de ser uma mera política de defesa.
Tal como no manifesto, também eu defendo um reposicionamento da esquerda relativamente a Israel, só apoiando este estado na situação que referi (o que equivale a não apoiar a sua política externa e mesmo interna). Também julgo que o que aqui afirmo deve ser dito com “clareza” a Israel. A esquerda não tem (nem deve) de fazer nenhum tipo de cedência relativamente a Israel. É Israel que tem de vir ao encontro da esquerda, se quiser efectivamente o seu apoio.
O Tiago enumerou ontem as pessoas que apoiaram na blogosfera portuguesa o manifesto que ele lançou. É curioso que entre os apoiantes (de um manifesto “das esquerdas”) se contem mais pessoas de direita do que de esquerda, sendo que entre as primeiras está André Azevedo Alves, que recentemente se destacou como o maior defensor na blogosfera portuguesa de Salazar para o “maior português de sempre”. Já todos sabíamos que Israel era apoiado pela direita belicista, religiosa e fundamentalista. O que é curioso é que, em Portugal, essa direita é descendente da Inquisição e de quem expulsou do nosso país os judeus (a começar justamente pelo ultracatólico Azevedo Alves)! Servir como arma de arremesso e instrumento de chantagem da direita e da extrema direita, como este texto tão bem ilustra: é a isso que Israel chegou.

Publicado também no Cinco Dias.

Monday, April 23, 2007

Eusébio em muito boas mãos

Lembro-me da história de Ronald Reagan, que quando foi vítima de um atentado e teve de ser operado de urgência, quis saber se os seus médicos eram republicanos ou democratas. Será que Eusébio quis saber se os seus médicos eram benfiquistas? O médico que o atendeu na urgência (e o acompanhou ontem) chamava-se, nem mais nem menos, José Roquette, pelo que a probabilidade de decepção era alta!

Desejo as melhoras e uma rápida recuperação ao Pantera Negra.

É da cor das cadeiras, seus cagaréus desconfiados!

Quis o destino que os meus dois clubes favoritos tivessem os estádios, construídos para o Euro 2004, desenhados pelo mesmo arquitecto, Tomás Taveira. Que é como quem diz: quis o destino que os meus dois clubes favoritos tivessem os estádios mais feios. O do Sporting, como é bem sabido, de fora parece uma casa de banho. O do Beira Mar consegue não ser tão mau, mas (como era de se esperar) tem uma combinação de cores berrantíssimas.
O Sporting, entretanto, lá chegou à final da Taça, como era a sua obrigação. No rescaldo desse jogo, o Beira Mar quer conferir o número de espectadores pagantes da partida de Alvalade, uma vez que no estádio lhes parecia estarem muito mais pessoas. Mas será que eles não sabem que um dos taveirismos mais característicos destes estádios é terem uma cadeira de cada cor (aleatoriamente distribuídas, de muitas cores diferentes)? Será que não sabem que um dos efeitos que tal taveirismo causa é, para quem está no campo, a ilusão de a assistência ser maior? Deveriam saber, pois têm o mesmo no estádio deles (que por sinal costuma estar bem vazio).
Vejam é se ganham à Académica!

Sunday, April 22, 2007

Bryan Ferry e a estética fascista

(imagem: Bryan Ferry, demonstando a célebre técnica fascista dos dois microfones e da franja assimétrica)

Quando ouvi esta semana que a comunidade judaica britânica estava ofendidíssima com Bryan Ferry e lhe exigira um pedido de desculpas público, preparei-me imediatamente para juntar a minha voz ao coro de protestos. O álbum de versões de Dylan não é uniformemente péssimo, mas algumas das faixas transpõem efectivamente a barreira do que é tolerável mesmo em sociedades democráticas onde a liberdade de expressão é um valor inegociável. O que não implica apenas, convém frisar, a comunidade judaica: Bob Dylan é património mundial e a forma atroz como a palavra 'avenue' é pronunciada na versão Ferryesca de «Just Like Tom Thumb's Blues» é algo que afecta toda a raça humana. Um pedido de desculpas era o mínimo exigível.
Meia dúzia de noticiários depois, contudo, tornou-se claro que a minha interpretação das exaltadas manchetes dos tablóides tinha sido algo precipitada. A controvérsia fora despoletada por uma entrevista de Ferry a um jornal alemão, durante a qual se referiu em termos elogiosos à iconografia nazi. (Pode encontrar-se uma boa colecção de recortes sobre o caso no Provas de Contacto).
Há um debate interessante, que não é novo, nem nunca foi satisfatoriamente encerrado, sobre a separação entre o estético e o ideológico, mas não posso ser o único a pensar que uma entrevista do ex-vocalista dos Roxy Music não é o melhor dos catalisadores para o seu reatamento. Se cedo à tentação é apenas porque sou fraco.
Antes de mais, um disclaimer: estou muito longe de ser um perito na história cultural ou militar da Alemanha nos anos 30 e 40 (ao contrário do meu primo Miguel). Sobre os méritos específicos dos documentários homoeróticos de Leni Riefenstahl e da arquitectura asséptica de Albert Speer haverá certamente quem tenha coisas mais interessantes a dizer (pessoalmente, não retiro grande fruição estética de competições de mergulho nem de Legos gigantes).
Impõe-se também uma reiteração do óbvio: uma parte substancial de produção artística que interessa e prevalece é feita por rematados canalhas - como sabe qualquer admirador da prosa de Burroughs ou da poesia de Pound. Se eu decidisse filtrar a arte que consumo através das opiniões pessoais ou tendências ideológicas dos artistas que a produziram, as minhas estantes estariam cobertas de pó - e pouco mais.
Dito isto, também não me parece sensato cercear a polémica com a ligeireza tentada pelo porta-voz de Ferry. Há uma enorme distância entre admirar um poema modernista separando-o do anti-semita espancador de mulheres que o escreveu, e elogiar todo um programa estético indissociável do movimento político que o originou. O nazismo foi, no célebre epigrama de Benjamin, a estetização da política, e se isto não é um argumento consensual, carrega legitimidade suficiente para evitar que um tão afoito pano caia sobre o debate.
É inteiramente possível descontextualizar o Triumph des Willens da sua intenção propagandística (embora Susan Sontag tenha montado um argumento persuasivo contra o gesto), tal como é possível descobrir uma beleza terrível numa explosão nuclear sem que isso implique qualquer juízo aprobatório sobre Nagasaki. Mas se atentarmos nas declarações de Ferry, ele não se refere apenas aos filmes de Riefenstahl nem às maquetes de Speer: são também as bandeiras, as insígnias, os uniformes e, crucialmente, os desfiles, que ele caracteriza como "just amazing" e "really lovely". E aqui divergimos. Tenho sérias dúvidas que uma resposta estética ao comício de Nuremberga possa acontecer num vácuo histórico; é necessariamente influenciada pelo que sabemos sobre o evento, pelos seus prefixos e sufixos tangíveis. Bryan Ferry está no seu pleno direito de assistir a uma demonstração impecavelmente encenada de força, disciplina, homogeneidade racial, e respostas em massa a um único estímulo que é a figura de Hitler, e achar que tudo aquilo é "really lovely". No meu caso, inclino-me mais para o "fucking terrifying", ou, em dias mais solarengos, pelos menos para o "quite unsettling".
Não sendo de todo, como já disse, um perito na matéria, parece-me significativo que a influência de Riefenstahl se faça notar não tanto em outros cineastas (se ignorarmos George Lucas, o que devemos sempre fazer, e talvez Ridley Scott, não me ocorre mais nenhum) mas sim na publicidade televisiva das décadas de 50 e 60. O que atraiu os directores comerciais da época foi a mesma capacidade de vergar multidões a um impulso único que viria a atraír outra estrela musical obcecada com a gestão da sua imagem pública: David Bowie, que já é um veterano nestas andanças da iconografia nazi. O factor ideológico, nele tal como em Ferry, é evidentemente irrelevante. O essencial eram os casacos de cabedal e os penteados anatómicos das SS, bem como o elemento de xamanismo e performance-art dos comícios nazis, que já foram descritos como os primeiros concertos de rock da História.
Tudo isto é ilustrativo de uma das mais perigosas características dos sistemas totalitários: o fascínio que o elemento visual e utópico exerce sobre mentes fundamentalmente sãs, mesmo aquelas equipadas para sentir repulsa pelas consequências práticas da respectiva ideologia.
Mas reafirmo a minha crença de que nenhuma destas considerações terá passado pela cabeça impecavelmente penteada de Bryan Ferry. Ele limitou-se a expressar uma ideia muito pouco ofensiva e muito pouco original: a de que os meios de propaganda nazis eram de uma eficácia tremenda. Fê-lo de uma forma pouco profunda e numa linguagem banal. E embora a superficialidade e a banalidade fossem duas marcadas características nacional-socialistas, isso não faz de Ferry um candidato a Eichmann do séc. XXI, a não ser para os praticantes deste straussiano desporto.
Aquilo com que certas pessoas decidem ofender-se é que nunca deixará de me surpreender.

(E vou esperar sentado pelo pedido de desculpas que realmente se impunha: "down on Rue Morgue Avenuuuuuuu"?).

Sempre a aprender

Qual é a convenção social para aquelas situações em que uma pessoa chegada nos surpreende com um gesto pleno de boa vontade, mas cujos resultados práticos são nulos? Aprendi esta semana que não se deve dizer: "Olha, pessoa chegada, apreciei muito o teu gesto pleno de boa vontade, mas deixa-me que te diga - os resultados práticos foram nulos".
Parece que é má onda.

Saturday, April 21, 2007

Os dias da Música



Arrancou ontem à noite,no CCB,o programa de "Os dias da Música" este ano centrados no piano.

Bernardo Sassetti fez uma primeira parte ao seu melhor nível, em improviso sobre Bartók e Frederico Mompou, e rematando com um trecho das Variações Goldberg.

Na segunda parte o pianista Hüseyin Sermet, acompanhado pela Orquestra de Câmara Wrttemberg- Heilbronn dirigida por Ruben Gazarian,tocou o concerto número cinco de Beethoven.

O maestro, jovem como muitos dos músicos, conseguiu galvanizar a orquestra que me pareceu subdimensionada para a peça tocada.
O pianista mostrou grande segurança nos movimentos rápidos.
No andamento central tive a impressão de que nem sempre dominou a complexa dinâmica da lentidão.

No seu conjunto o concerto foi um sucesso e penso que nós, o público, saímos todos satisfeitos.
.

Friday, April 20, 2007

Eleições em França: ando com uma cara!

A escolha é difícil. Tal como o Rui Curado Silva, e precisamente pelos mesmos motivos, penso que o melhor candidato a estas eleições (visto de fora, pelo menos) é a ecologista Dominique Voynet, pelos motivos que o Rui aponta. Não é propriamente uma novidade, mas as novidades desta campanha são poucas e más.
Só que estas não são eleições legislativas. Só uma pessoa será escolhida, o Presidente da República. A esquerda francesa não pode cometer o mesmo erro de 2002 (apesar de o número de candidatos não ser muito inferior). Para evitar ter, pela segunda vez consecutiva, na segunda volta um candidato de direita e um de extrema direita (ou, pior ainda, dois candidatos de extrema direita), acho que se fosse francês acabaria por votar, muito a contragosto, em Ségolène Royal. Só que nunca, em nenhuma outra eleição, me sentiria tanto como o pai da Liberdade (da clássica tira de Quino) como nesta. Isto partindo do pressuposto que Ségolène ganha, o que está longe de ser adquirido!

A minha ida ao "Um Contra Todos"

Era daqueles que seguia diariamente o concurso da RTP Um Contra Todos, achava que era um contributo divertido para estimular a nossa cultura geral, apesar de muitas das perguntas se reportarem a "fait-divers" mais comezinho, tipo onde nasceu ou com quem esteve casado este ou aquele actor, ou ainda em que clube ou em que lugar jogava tal futebolista.



A História de Portugal, para não assustar os concorrentes, restringia-se aos últimos 50 anos ou algumas das perguntas sobre literatura portuguesa referiam-se às inesgotáveis obras da Margarida Rebelo Pinto. Malato, o apresentador do programa, tem espírito e consegue, em algumas tiradas dar um tom progressista, num local que prima sempre pelas opiniões reaccionárias ou, pelo menos, pela defesa da ideologia dominante. Veja-se, por exemplo, quando o Jorge Gabriel apresentou um programa semelhante referiu-se a Chávez, como um anti-americano primário, reproduzindo as ideias feitas sobre esta matéria.
Foi com este estado de espírito que resolvi inscrever-me no concurso. Depois de muitos telefonemas para cá e para lá, mas sempre afáveis e simpáticos, e um interrogatório por telefone a testar os meus conhecimentos gerais, eis que surge o dia em que devo comparecer às 10h30 na Televisão. Pedem-me que leve duas mudas de roupa, não vá eu ir à cadeira. Como são gravadas três sessões por dia, tem que se dar ao telespectador a sensação de que o concorrente está a ser inquirido em três noites diferentes
Como não sabia o tempo que levaria a chegar à televisão e devido aquele espírito antes-de-já, que é próprio dos sexagenários, cheguei com vinte minutos de antecedência. Esperava eu que entrasse, fosse levado para uma sala e esperasse até chegarem todos os 51 concorrentes. Engano meu. Esperámos à porta da televisão, por acaso não foi ao vento e à chuva, porque nesse dia fazia Sol, mas por aquilo que me foi dado perceber, devia ser essa a situação normal. Só mesmo às 10h30 é que chegou uma menina que confirmou a nossa presença. Depois, reuniu-nos e levou-nos para o estúdio, onde nos entregaram um conjunto de folhas, para nos identificarmos e declararmos que renunciamos a todos os direitos de reclamar contra a Endemol, a produtora do programa. Tipo quando instalamos um novo software no nosso computador e a firma produtora nos espolia voluntariamente de todas as possibilidades de no futuro reclamarmos contra qualquer maldade que ela nos faça. Já se sabe que assinei sem me dar ao trabalho de ler todas as alíneas, tal como aceito todos os programas de computador sem ler todos os direitos a que renuncio. Tristes vão os tempos que para se fazer qualquer coisa é preciso comprometermo-nos a não pormos em tribunal com quem nos relacionamos. Qualquer dia para fazermos amigos temos que previamente assinar uma declaração a dizer que no futuro não nos tornaremos seus inimigos.
A sala onde esperamos, onde assinamos a declaração e onde comemos é sempre a mesma, acanhada, com mesas de contraplacado e desprovida de qualquer decoração. Lateralmente tem um pequeno bar, com máquinas de café portáteis e em que o balcão é igualmente uma mesa. Um local sem condições e pouco simpático. No entanto, convencido que estava a fazer um favor à televisão participando no seu concurso, pensei que, tal como em todos os locais onde há conferências, colóquios, etc., poderia ir tomar o coffe break sem pagar nada. Puro engano, o café era a 0,50 €, como em qualquer cafetaria, com muito melhores condições. Sobre pagamentos, soube também que, aos participantes que vinham da província, não era paga a estadia em Lisboa, ao contrário do que sucedia anteriormente. É a crise.
Esperámos e só por volta do meio-dia fomos para o estúdio para gravar o programa. Depois de muitas experiências, justificáveis para quem como eu estava naquelas andanças pela primeira vez, lá se dá início à sessão. O Malato aparece com ar de sono, dizendo que a mãe o tinha acordado às dez, ainda por cima ligando a seguir o aspirador. Todo o programa tem este ar familiar, com um tal Betão, um brasileiro grande, a comandar as tropas, contando anedotas ordinárias, que ultrapassam as raias do dizível. As referências sexuais, supersticiosas e religiosas, tipo seita, são comuns durante todo o dia. O Malato sempre com um ar enfastiado e cansado, transmite a sensação de que é uma grande estafa fazer o programa. O que não deixa de ser verdade porque, segundo percebi, durante três dias, 4º, 5º, e 6º feiras, do fim da manhã até às oito da noite, foi a hora a que acabou a última gravação, vai, apesar das longas interrupções, fazendo momices e perguntas aos seleccionados.
Apesar de já ter sido avisado telefonicamente, os concorrentes têm que estar de pé durante as gravações, resta-lhes nos intervalos um banquinho de plástico, da loja dos trezentos, para aliviarem o seu cansaço. As gravações são morosas, sempre antecedidas de novos ensaios, que, para um leigo, dão a sensação de que se está à espera que o apresentador se disponha a gravar. Como experiência fica-nos um dia que começa às 10h30 e acaba ás oito da noite, a maioria dele passado em pé, sem se ver a luz do dia, almoçando gratuitamente na sala onde se espera, mas com lanche e cafés pagos. No fundo, uma canseira. Há concorrentes que se oferecem para ir lá no dia seguinte, eu pagava para não ir.
E o concurso. Falava-se à boca pequena, que a primeira concorrente que foi seleccionada para ir à “cadeira”, e em teoria ela deveria sê-lo por ter sido a mais rápida a responder a uma determinada pergunta, já tinha sido previamente escolhida. Não sei se é verdade, mas que a senhora vinha muito bem arranjada, como se fosse para uma passagem de modelos, quando todos os concorrentes aparecem vestidos informalmente, é a pura das verdades. Só a sua ignorância é que era maior do que o seu ar.
Já se sabe que chumbei quando me perguntaram, para além das que estavam indicadas, qual era a modalidade que faltava no pentatlo: canoagem, natação ou salto em altura. Fugiu-me logo o dedo para o disparate: salto em altura. Era natação. O desporto não é o meu forte.
Resta-me a consolação de numa das sessões ter chegado aos últimos seis. Esta terminou com a pergunta, que a concorrente em jogo não soube responder, quem é que tinha realizado os filmes “Acossado”, “O Desprezo” e “Pedro o Louco”. Como eu gostaria de ter dito ao Malato que era o Jean-Luc Godard, e que o primeiro era o “À Bout de Souffle” (1959), segundo “Le Mépris” (1963) e o terceiro “Pierrot le Fou” (1965). Que “Acossado” termina com o Jean-Paul Belmondo a morrer, caído no chão da rua, e a fechar com a mão os olhos a si próprio e o terceiro , com o mesmo actor, com dinamite enfiado na cabeça a tentar apagar o rastilho que tinha acabado de acender. Como estes foram os filmes da nossa juventude ou pelo menos da memória que guardamos deles e mesmo que os odiássemos, era porque eles eram o cinema do nosso tempo.

Cara Fernanda Câncio:

Não se preocupe com textos escritos com os pés. Responda-me antes a uma questão, sff. Isso da esquerda por israel (eu, por exemplo, às vezes) o que quer exactamente dizer? A Fernanda é às vezes por Israel? Ou é às vezes de esquerda? Ou é às vezes uma coisa, às vezes a outra?
(E continue a chatear. Chateie sempre. Não chateia nada.)

The hamster gambit

Outro remake de Maradona, com orçamento mais baixo, num pequeno cinema independente, aqui há uns anos

Thursday, April 19, 2007

Isto é tão bom, tão bom que chega a ser deprimente


Da natureza do fanatismo


Já depois de ter escrito o post anterior, em que referi a questão do fanatismo, tive acesso ao fabuloso "Contra o Fanatismo" de Amos Oz.
O livrinho foi distribuído com o jornal Público e eu recomendá-lo-ia em todas as escolas.

Posso dizer que encontrei uma "alma gémea" e que subscrevo tudo o que o livro diz; gostava muito de ter o seu talento e não me importo nada que os meus escritos pareçam plágios de Amos Oz. Aqui fica um "aperitivo" retirado do referido livro:

Vou contar uma história em jeito de divaga­ção: eu sou um reconhecido divagador, estou sem­pre a divagar. Um querido amigo e colega meu, o admirável romancista israelita Sammy Michael, pas­sou uma vez pela experiência, por que todos nós passamos de vez em quando, de andar de táxi du­rante um bom tempo com um condutor que lhe ia dando a típica palestra sobre como é importante para nós, Judeus, matar todos os Árabes. Sammy ouvia-o e, em vez de lhe gritar, «Que homem hor­rível que você é! É nazi ou fascista?», decidiu ir por outro caminho e perguntou-lhe: «E quem acha que deveria matar todos os Árabes?» O taxista dis­se: «O que quer dizer com isso? Nós! Os Judeus Israelitas! Temos de o fazer! Não há escolha. Veja só o que nos fazem todos os dias!» «Mas quem, especificamente, é que deveria fazer o trabalho? A polícia? Ou o Exército talvez? O corpo de bom­beiros ou as equipas médicas? Quem deveria fazer o trabalho?»
O taxista coçou a cabeça e disse: «Penso que devíamos dividi-lo em partes iguais entre cada um de nós, cada um de nós devia matar alguns.» E Sammy Michael, ainda no mesmo jogo, disse: «Pois bem, suponha que a si lhe toca um determinado bloco residencial da sua cidade natal, Haifa, e que bate às portas ou toca às campainhas, e pergunta: 'Desculpe, senhor, ou desculpe, senhora. Por acaso é árabe?' E se a resposta for afirmativa, você dispa­ra. Quando acaba o seu bloco, dispõe-se a regressar a casa, mas, ao fazê-lo,» continuou Sammy «ouve, algures no quarto andar do seu bloco, o choro de um bebé. Voltaria para matar o bebé? Sim ou não?» Houve um momento de silêncio e, então, o taxista disse a Sammy: «Sabe, o senhor é um homem muito cruel.»


Se quer ler o resto deste belo texto, o capítulo "Da natureza do fanatismo", clique AQUI
.

Mais um massacre na terra das oportunidades (III)

Respondo agora a dois blogues que me interpelaram sobre o primeiro texto desta série.

Caro André, não desmentiste que o controlo do porte de armas diminui (não vou ao ponto de dizer que resolve) a violência, pois não? Para já é só isso que se quer: diminuir a violência num país que tem tudo para ser seguro, mas não é mais graças a incidentes como este.

Caro Pedro, existem muitas tensões entre a liberdade individual e outros valores importantes, como a igualdade (não é só a segurança). Eu não sou liberal e nem libertário, pelo que para mim a liberdade individual não é o valor supremo.

Partilho o interesse do Pedro pelas pessoas “que estão permanentemente a apelar ao respeito pelas formas organizacionais societárias árabes e outras" mas que, "sempre que estas desgraças acontecem", põem "em causa os princípios básicos da organização social norte-americana”. Mas certamente não sou eu que apelo ao respeito incondicional pela organização tradicional das sociedades árabes, como pode certamente ser confirmado por alguns dos meus textos, neste e noutros blogues.
Deduzir que, por eu ser de esquerda, sou necessariamente um defendor dessa organização, nessa e noutras sociedades, é assim como deduzir que, lá por se escrever na “Atlântico”, é-se necessariamente contra a despenalização do aborto. Não é, Pedro?

Sei perfeitamente que o porte livre de armas é (infelizmente) um princípio fundador da sociedade americana. Conheço eleitores de Ralph Nader que não são a favor do controlo de tal porte. Mas não é isso que me impede de defender que uma sociedade com livre porte de armas de fogo é, tal como uma sociedade onde as mulheres são obrigadas a usar um véu independentemente da sua vontade, contra os meus princípios. Contra ambos lutarei, pouco me importando em ambos os casos com a “liberdade individual” que (como em todas as sociedades liberais) acaba por ser só a liberdade do mais forte.

Finalmente, no meu anterior texto sobre este assunto eu afirmei que o livre porte de armas numa sociedade implica (por razões de segurança) que esta se torne numa sociedade policial (é o caso da sociedade americana). Eu afirmei que, sem descurar a importância do policiamento, prefiro uma sociedade menos policial e com o porte de armas controlado. Fiquei sem perceber qual é que os meus prezados interlocutores preferem.

Mais um massacre na terra das oportunidades (II)

Editorial do The New York Times de ontem:
Our hearts and the hearts of all Americans go out to the victims and their families. Sympathy was not enough at the time of Columbine, and eight years later it is not enough. What is needed, urgently, is stronger controls over the lethal weapons that cause such wasteful carnage and such unbearable loss.
No blogue Cosmic Variance: It is good to see some outrage
The number of children under the age of 17 shot by guns in America every year is greater than the gun-related deaths of children in all the industrialized nations of the world COMBINED.

Wednesday, April 18, 2007

Cair na real

Cheguei a alinhavar um texto sobre Sócrates e a Universidade Independente, mas depois dos mais recentes desenvolvimentos, confesso que decidi não publicar nada por agora. Mas com isto fico com uma sensação duplamente desagradável de ter perdido tempo e de não me restar nada para dizer. Nem do futebol me apetece falar (e razões para isso não faltavam - desde gozar com os benfiquistas até à meia-final da Taça de Portugal que hoje se joga entre os meus dois clubes favoritos). Enfim, numa derradeira homenagem ao Euler (e uma vez mais graças ao Nélson), deixo-vos um cartoon com dois bons conselhos.

As Bruxas da Memória


Nasci numa família um pouco esquizofrénica no plano religioso.
Por um lado o meu pai era, e ainda é aos 94 anos, profundamente anticlerical. Por outro, a minha mãe foi praticando abnegadamente o catolicismo até que, depois do 25 de Abril e com mais de 60 anos, se afastou irremediavelmente da igreja.

Eu, levado pela minha mãe desde muito cedo, frequentei as missas e só nos meus dezasseis anos me “zanguei” com a igreja sob o pretexto das perguntas indiscretas, e insistentes, durante a confissão dos meus ingénuos “pecados sexuais”.

A maravilhosa disponibilidade da adolescência levou-me directamente da admiração pelas realizações do Salazar, descritas ao pormenor no Diário de Notícias, para a militância clandestina no PCP, em 1966. Devo isso a alguns amigos que me acompanharam, e acompanham, ao longo da vida.

Vem isto a propósito do livro da Joana,”As Brumas da Memória”, para que se perceba por que vou dizer aquilo que vou dizer.

A juventude é dada aos fanatismos e eu, confesso, pensei durante muito tempo que os fanatismos se dividiam entre os bons, que eram os nossos, e os maus que eram os dos outros. No caso dos católicos progressistas a imagem que eu tinha, na minha fase militante da juventude, era mais a dos equivocados que embora subordinados a um fanatismo dos maus queriam “dourar a pílula” com uns “tagatés” ao contrário.

Uma vez ou outra o funcionário do Partido com que na altura me encontrava lá mencionava uma vigília qualquer, como quem diz “não estamos sós”, mas a coisa tinha um certo ar folclórico quando comparada com as elaboradas técnicas conspirativas que nós praticávamos.

Só muito mais tarde a vida me ensinou a abominar os fanatismos todos. O meu problema agora é cuidar, todos os dias, de não os abominar fanáticamente.

Tal como os vírus que habitam, sem consequências, os nossos corpos também o fanatismo, nas suas várias formas, pode permanecer inócuo. Em determinadas circunstâncias degenera em formas agudas de imposição aos outros de “verdades inquestionáveis”.
A cadeia de raciocínios é simples: se a “verdade” é inquestionável torna-se incompreensível que alguém a não queira ou que a ela resista; essa recusa da “verdade” indicia incapacidade ou perfídia; em qualquer dos casos, como a “verdade” é inquestionavelmente favorável, resulta legítimo impô-la aos relapsos mesmo contra a sua vontade.

O facto de rejeitarmos o fanatismo não significa que devamos rejeitar a adesão a ideais, ideologias, misticismos ou utopias. Significa, isso sim, a adopção da relatividade e falibilidade dos julgamentos humanos que reserve para casos extremos, prementes e inevitáveis, a substituição da persuasão pelo uso da violência física ou intelectual.

Talvez por tudo isto penso que a Joana escreveu o livro no tempo certo; pelo que vai no mundo, porque há uma geração que começa a despedir-se e, para além de tudo o mais, porque só agora eu já estou em condições de o ler.
Se tivesse escrito antes talvez eu não fosse capaz de apreciar a hábil mistura de marcantes experiências pessoais, episódios pitorescos e verdadeiros “factos históricos”.

Talvez a ternura com que os leio não tivesse sido possível.
.

Tuesday, April 17, 2007

I'll bet you told her all your trees were Sequoias


Os meus filmes preferidos de Hitchcock, e consequentemente os melhores filmes de Hitchcock, são Rear Window (1954), To Catch a Thief (1955) e The Trouble With Harry (1955). O que os une, para além da proximidade cronológica, é o facto de todos terem sido escritos por um génio quase desconhecido chamado John Michael Hayes (que também viria a trabalhar no remake americano de The Man Who Knew Too Much).
A frutuosa colaboração é relatada neste divertido livrinho de Steven DeRosa, que recomendo a todos os que apreciam uma boa história de copos: o primeiro encontro foi uma esplêndida reunião no Beverly Hills Hotel à qual, por motivos diferentes, ambos compareceram espectacularmente embriagados.
A composição do meu pódio hitchcockiano tem outros motivos, claro, mas o essencial é este: John Michael Hayes escreveu os melhores diálogos javardos da história do cinema. Nesta era nefasta em que vivemos, quando a música de feira e as comédias da SIC detêm o monopólio da double entendre, convém lembrar que os trocadilhos sobre a perninha ou o peitinho do frango também podem ser uma forma de arte.

(O visual é muito bonito, mas no fundo, no fundo, eu continuo a ser um escravo do diálogo a cem à hora. Dêem-me uma caixa de screwball comedies e eu fico quietinho sem incomodar ninguém durante um fim-de-semana inteiro.)

A Complexidade de Portnoy

Não me importo de explicar isto uma terceira vez: o nome deste blogue não se deve a nada nem significa coisa nenhuma.
Há pessoas de bem - pessoas formidáveis - que retiram os nomes dos seus blogues de passagens da Bíblia; de atracções turísticas conimbricenses; de livros de Robert Venturi. Este método alusivo de baptismo merece todo o meu respeito e, com hindsight, é um que eu gostaria de ter seguido.
Mas a desglamourizada verdade é esta: depois de ver seis tentativas de baptismo recusadas pelo Blogger (o que prova a minha gritante falta de originalidade, ou a minha sintonia com o zeitgeist), peguei numa página aleatoriamente seleccionada de um dicionário de bolso e usei a primeira palavra que lá li: pastoral. O Roth não tem nada a ver com isto, e não devemos enlamear o seu santo nome associando-o a um espaço que apenas por acaso não se chama Cistografia Portuguesa, Patanisca Portuguesa, ou Fotossensibilidade Portuguesa.

(American Pastoral, nem de propósito, é o livro de Philip Roth de que menos gostei. Algo susceptível de causar grande consternação a Philip Roth, pelo que peço comedimento no espalhar da notícia.)

Mais um massacre na terra das oportunidades

Que posso dizer sobre o massacre da Universidade da Virginia? Recomendar a todos (uma vez mais) que vejam o Bowling for Columbine e, de uma forma algo egoísta, agradecer aos alunos da State University of New York onde estudei serem gente tão tranquila e permitirem-me estar aqui a escrever-vos.
É nestas alturas que a omnipresença da polícia na sociedade americana (em particular, neste caso, nas universidades) parece justificada. É evidente que o policiamento é importante (em particular, deveria ser maior em Portugal em geral), mas - como mais este triste caso demonstra - não resolve tudo. O grande problema da sociedade americana, a causa da insegurança, está no livre porte de armas. A solução está no controle do porte de armas, que é preferível à manutenção do estado actual, que é uma sociedade policial e securitária. Se há quem veja nesse controle uma restrição das liberdades pessoais (e daí?), pergunto-me: e o que verão numa sociedade policial e armada até aos dentes?

Monday, April 16, 2007

Não choveu



Foi a pior Grand National de que tenho memória: uma série de falsas partidas e um steward com um caso extremo de retenção anal ameaçaram transformar a corrida numa farsa antes sequer da primeira sebe ser transposta. O pior estaria para vir, contudo, com a vitória a sorrir o seu sorriso esborratado de lipstick foleiro ao palerma Robbie Power, justamente punido com quatro dias de suspensão por uso excessivo do chicote (só por acaso não escavacou uma rótula ao animal). Razão, suponho, para cobrir de elogios o cavalinho vencedor, Silver Birch, que mais não seja pela contenção que revelou. Outros cavalinhos, por muito menos, fizeram aquilo que ele deveria ter feito: usar a transposição de um obstáculo como pretexto para depositar cuidadosamente o seu jockey na relva.
Tudo isto torna ainda mais vergonhoso o facto de ter sido esta a única Grand National nos últimos 5 anos a dar-me algum dinheiro - Slim Pickings, o cavalo irlandês que era a minha back-up bet, chegou em terceiro lugar, o que rende 1/3 das odds, embora não chegue a restaurar 1/33 de auto-estima. Quanto ao cavalinho Dun Doire, ficou provada a sua completa incapacidade para competir em terrenos que não se assemelhem às trincheiras do Somme. Dun Doire é o equivalente equestre àquelas equipas de futebol que só ganham partidas jogadas em lamaçais - como o antigo estádio/quintal do Gil Vicente, de cujo nome agora não me recordo, mas que espero já tenha sido demolido para dar lugar a uma estufa. Já agora, para quem gosta de ver jockeys derrotados passarem um lenço saturado em graxa pela carapaça do cágado, Paul Carberry escreveu uma autópsia para o The Guardian. Para o ano há mais.

(A árvore da imagem é um silver birch, julgo eu. Que é o nome inglês para um vidoeiro, julgo eu. Mas nestas coisas, é sempre melhor ir confirmar aqui, ou perguntar ao João Miranda, que sabe tudo.)

Euler na blogosfera

"Geralmente um grande cientista fica imortalizado por uma contribuição central na sua carreira: a Gravitação de Newton, a Lei de Gauss, a Hipótese de Riemann, a Relatividade de Einstein. Mas, se um matemático referir no abstracto o “Teorema de Euler”, ninguém poderá sequer saber de que ramo da Matemática está ele a falar, tal a abrangência do seu legado científico." (Jorge Buescu, De Rerum Natura.)

"Leonhard Euler: 300th anniversary
Written three centuries after the birth of a famous 18th century string theorist
(...)
As you can see, Euler was quite an impressive mathematically-inclined string theorist who was ahead of his time. He counts as the most prolific mathematician of all time and a guy who wasn't stopped by blindness. I wonder whether back in the 18th century, aggressive crackpots were attacking Euler for not being sufficiently scientific just like they do today."
(Lubos Motl, The Reference Frame.)

O Insurgente no buraco negro

Quando os soviéticos colocaram o primeiro satélite em órbita, o Sputnik, a reacção de um responsável do regime salazarista foi de incredulidade: tudo não passava de “propaganda comunista”. Colocar um satélite em órbita implicava vencer a gravidade (neste caso da Terra), e tal não era possível (pelo menos por parte dos soviéticos). O regime salazarista vivia assim num buraco negro (de cuja gravidade não se pode efectivamente escapar), sem nenhuma comunicação com o exterior, e queria puxar Portugal para lá. É natural que o mesmo se passe com o mais salazarista dos blogues, e com alguns dos seus elementos, salazaristas ou não. Refiro-me, é claro, ao Insurgente e a este texto de Bruno Alves onde, no meio de uma série de delírios, o autor garante que “a gravidade vence sempre", isto é, não se pode escapar à gravidade. A total falta de contacto com a realidade exterior que o texto evidencia só o confirma: o autor escreve, pelos vistos, do interior de um buraco negro.

Sunday, April 15, 2007

Leonhard Euler



A mais bela equação da Matemática, que relaciona os cinco principais números, deve-se a este matemático nascido há 300 anos em Basileia. De entre as suas inúmeras contribuições para a Matemática, destaco as mais simples (não requerem conhecimentos técnicos para serem entendidas) e, por isso mesmo, mais poderosas. Outro exemplo, que ninguém antes tinha provado: num poliedro, o número de faces mais o de vértices é igual ao de arestas mais dois (f+v=a+2). E muito mais. Euler é seguramente das pessoas a quem a Matemática mais deve. A imagem da mais bela equação acima é extraída do Público, que publica hoje uma excelente evocação do cientista, por Ana Gerschenfeld.

Era uma vez uma fábrica...

Era uma vez uma fábrica militar que dava pelo nome de FNMAL, Fábrica Nacional de Munições para Armas Ligeiras, e que nos anos oitenta foi integrada, juntamente com outras, na INDEP, Indústrias Nacionais de Defesa. Ficava ao fundo da Avenida de Moscavide.




Durante mais de trinta anos vi da minha janela a sua imponente chaminé de tijolo.





Centenas de pessoas que ainda hoje vivem em Moscavide trabalharam nesta fábrica e, muitas delas, passaram dentro da FNMAL a maior parte das suas vidas.
Em 2001 as instalações da FNMAL foram encerradas e nunca mais voltaram a funcionar.

Durante anos os edifícios aguardaram, no seu recolhimento e decadência, aquilo que o destino lhes reservasse.









No dia 12 de Fevereiro de 2007 apercebi-me de movimentações pouco usuais para alguém que passa frequentemente no local. Pareceu-me que se preparavam para a demolição. Quem ? porquê ? ninguém no local me soube explicar.

Desde essa data, nos últimos dois meses, a maquinaria abateu-se sobre os velhos pavilhões.







Como pretendia saber o que se estava a passar e o que se preparavam para construir no local dirigi-me à junta de Freguesia de Moscavide onde o próprio Presidente me disse, com a maior das calmas, que nada sabia sobre o assunto.
Deixei o meu contacto para me telefonerem quando conseguissem a informação pretendida. Até hoje.

Enviei uma mensagem electrónica para o Município de Loures pedindo informações sobre o projecto mas, apesar de ter sido registada com o número 18184 de 16/02/2007, a pergunta nunca mereceu qualquer resposta.

Entretranto os trabalhos continuavam.







Então resolvi, no dia 3 de Abril de 2007, dirigir-me presencialmente ao atendimento do Departamento de Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Loures.

Para meu grande espanto comunicaram-me que nada sabiam sobre projectos para os terrenos da velha FNMAL em Moscavide. Simpaticamente sugeriram que me dirigisse ao Departamento de Projectos Estruturantes (ou seria Estorturantes ?) pois aí concerteza que saberiam esclarecer-me.

Lá fui, bastante esperançado, mas a única coisa que me disseram foi que uma empresa de nome MAVIFA solicitara autorização para demolir a antiga fábrica, aparentemente já depois de ter iniciado os trabalhos.
Sobre o futuro disseram-me, a muito custo, que um projecto para o local fora reprovado pela vereação e que se aguardava a reformulação do mesmo para eventual aprovação.

Entretanto a fábrica estava quase totalmente demolida.





E transformara-se, depois de triturada, num conjunto de montículos de terra.





Qual não é o meu espanto quando hoje, 10 de Abril, apenas uma semana depois de ter estado nos Projectos Estruturantes de Loures, vejo à porta da demolida fábrica este flamejante cartaz:





Eu para já não tenho nada contra o projecto, nem contra a empresa OBRIVERCA que o vai fazer (propriedade de um famoso dirigente desportivo), nem contra a indústria da construção em geral, mas que tudo isto cheira a esturro lá isso cheira.
No mínimo, no mínimo, houve um total desprezo pelo direito dos cidadãos à informação levando a suspeitar que se está a tentar esconder qualquer coisa.

Não há por aí ninguém disposto a fazer uma reportagem jornalística sobre tudo isto ? ou um trabalho académico no domínio da sociologia ?

Eu possuo, e posso disponibilizar, umas centenas de fotografias das operações de demolição e dos interiores da fábrica tal com eram imediatamente antes da demolição.

Friday, April 13, 2007

Encontro Público com a Ciência

Em Lisboa, é no Pavilhão do Conhecimento. A entrada é gratuita. Passem por lá.

"I'd like to eat Liz Taylor"



(Misheard Lyrics)

Esta é a razão do meu desconsolo

Do Público de hoje. Da entrevista de José Sócrates:

O fax do "desconsolo"

"Foi mandado em Novembro de 1996. O professor Luís Arouca convidou-me para dar aulas na universidade, depois de eu me licenciar. E eu estava tentado a aceitar, achava até honroso o convite. Depois descobri que não podia dar aulas porque estava impedido por lei. E mandei as duas leis, fundamentalmente a de 95 como digo no fax, em que é referido a expressa incompatibilidade de funções entre membros do Governo e qualquer actividade regular de dar aulas. O desconsolo é por isso, é por não ter podido aceitar"
É assim que se contratam docentes do ensino superior em Portugal. Nas "universidades" privadas de vão de escada, tipo "Independente", é o pão-nosso de cada dia. Ele é Sócrates, ele é Marques Mendes, ele é Santana, ele é Alberto João... Tudo grandes académicos.
Sr. ministro do Ensino Superior, caro prof. Mariano Gago, e se pensasse nisto? Se se certificasse de que as universidades contratavam gente competente, já viu quantos mais bolseiros poderiam estar empregados? Ficava bem para as estatísticas de que o prof. tanto gosta...

Grand National


Faltam menos de 20 horas para o evento desportivo do ano.

(Eu sei em que é que estás a pensar, leitor: estás a pensar que a vitória do favoritíssimo cavalinho Hedgehunter na Grand National de amanhã só poderá ser impedida por forças sobrenaturais. Mas as coisas não são assim tão simples, leitor. O cavalinho Hedgehunter, apesar de ser um vitorioso veterano do circuito de Aintree, tendo aqui ganho a Grand National de 2005, padece de um problema recorrente no joelho, que nada tem a ver com voodoo ou mau-olhado.
Por outro lado, o cavalinho irlandês Dun Doire, que tem uma excelente estrutura óssea e é treinado pelo grande Tony Martin, pode muito bem tirar vantagem do terreno molhado (façamos as macumbas necessárias a um satisfatório aguaceiro) para me tornar muito feliz pela segunda vez. Se bem te lembras, leitor, o cavalinho Dun Doire representou o meu único palpite correcto na amargura recente que foi o Festival de Cheltenham. O cavalinho Dun Doire foi, nessa festiva ocasião, sublimemente montado pelo jockey Ruby Walsh, que irá amanhã montar o cavalinho aleijado Hedgehunter. Como é irónico o mundo dos cavalinhos, leitor. Como geme, assustada, a minha conta bancária. Como está limpo o céu, e cheio de prenúncios.)

Memo para o Vasco Barreto (quando voltar de férias)

1. Vai ao Google Maps.
2. Carrega em 'Get directions'.
3. Introduz os termos 'New York, New York' e 'Lisbon, Portugal' nas caixas de busca no topo da página.
4. Prime a tecla Enter.
5. Lê a instrução número 23.

The inanities that I go sowing

O Tradução Simultânea faz hoje anos. O que me parece um motivo tão bom como qualquer outro para traduzir um post do Tradução Simultânea com o auxílio do Babelfish:

«WE ARE OPENED
Seems that much people who for have passed here would like to have commented the inanities that I go sowing. It happens that when making they had beaten it with the nose in the door, because this blog was formatted for ' members only ' or thing that is valid it. However even so I am partial to this concept, if April the commentaries does not make sensible to be here to say lonely. The situation already was attenuated. Therefore, feel free. The house is yours.»
(01/04/07)

Life is no way to treat an animal


Norman Mailer disse um dia que J. D. Salinger era a melhor mente a nunca ter saído do liceu. Kurt Vonnegut foi muito provavelmente o melhor escritor a nunca ter saído do infantário. O seu legado inclui dois ou três livros muito bons, dois ou três livros muito maus, desenhos a lápis, chavões omnipresentes, infelizes declarações à 'intelectual público', uma esplêndida caricatura de Theodore Sturgeon, e um dos melhores e mais cómicos livros que eu conheço, Mother Night.

A gente vê-se por aí, Odete

Thursday, April 12, 2007

Entre as Brumas da Memória - o blog


A Joana Lopes criou um blog dedicado ao seu livro "Entre as Brumas da Memória" que já aqui foi referido por mim e pelo Jorge Nascimento Fernandes.

Estas são as motivações da Joana nas suas próprias palavras:

"Decidi criar este blogue por ter recebido várias sugestões nesse sentido, de pessoas que entretanto leram o livro, que me comunicaram apreciações e que gostariam de conhecer reacções de outros. Algumas contaram-me histórias que eu desconhecia, relacionadas com a mesma época e com os mesmos temas - pode ser que se decidam a contá-las. "

A notícia do "Público" não é verdadeira

Refiro-me a este caso, sobre o qual tanta asneira se tem escrito na última semana. Imaginem se fosse com o Benfica...

"Yours": deve fazer parte da cadeira de inglês técnico

«O primeiro-ministro salientou que fazia parte de uma turma "especial", criada por alunos oriundos de outras instituições, para explicar a razão pela qual o seu professor de Inglês Técnico, o reitor Luís Arouca, não terá sido o regente dessa cadeira do curso de Engenharia Civil. (...) E, sobre o facto de ter usado como forma de se despedir, numa carta ao reitor Luís Arouca, antes de ter aulas na Independente, a expressão "do seu José Sócrates" garantiu que "costuma sempre terminar as cartas desta forma".» (Do Público de hoje.)

Wednesday, April 11, 2007

My Life as a Lord Jim

My Life as a Fake é, entre muitas outras coisas, uma ilustração da Falácia Intencional: nada do que é escrito pela trupe de artistas manqué que popula o livro surte os efeitos desejados. A narradora, depois de ler a inconsequente poesia genuína de Chubb (o forjador) resume assim a situação: «If this was his real poetry, then I preferred the fake».
Esta tensão entre o valor intrínseco daquilo que é criado para ser falso e daquilo que floresce genuinamente é o verdadeiro motor do livro, mais do que a reciclagem do mito de Frankenstein. Aliás, parece-me que My Life as a Fake tem um padrinho literário mais óbvio que Mary Shelley; é ela quem providencia a epígrafe, mas a sombra angular é lançada por Conrad - uma presença já evidente mesmo antes de o enredo nos transportar até à Península Malaia. A narração é oblíqua e esquartejada; o elenco é constituído quase exclusivamente por Marlows - personagens que insistem em contar as suas histórias, mesmo que o processo dure a noite toda e ameace aborrecer todos à sua volta. O que nunca acontece, diga-se. O livro é muito bom e reitero que deve ser lido por todos aqueles cujo coração é puro e cujas intenções são nobres.
(Curiosas, se bem que superficiais, são também as semelhanças do enredo com um dos livros mais fraquinhos de Stephen King, The Dark Half. Seria interessante aprofundar isto, mas o mais provável é que não o faça).

A Europa no meu prédio

O meu novo vizinho italiano, a quem educadamente me apresentei no corredor, insiste em que eu lhe chame Fred. A sua esposa nunca fala, mas o Fred comunica pelos cotovelos, ainda que o seu domínio da língua inglesa não lhe permita muito mais do que uma pitoresca insistência em que eu lhe chame Fred.
Julguei de bom tom alertá-los para o problema do carteiro. «Fred», disse eu, «he's a lunatic. You need to be on your toes».
«Call me Fred! I make your aquaintance!»

Factualidade declarada provada

Um dos textos mais comoventes que li nos últimos tempos foi este acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.

Citando Abraracourcix

Há alturas em que me sinto cansado, mas tão cansado.
Uma notinha pessoal: como alguns de vocês já devem ter reparado, o meu habitual atraso na resposta a e-mails, telefonemas, mensagens de texto e gritos escandalizados do outro lado da calçada assumiu nas últimas semanas proporções caricatas. Isto deve-se a toda uma conjuntura. Não vamos aqui escalpelizar a conjuntura. Os interessados, de resto, já saberão que a conjuntura não exclui factores como a preguiça, a má-educação, e um estilo de vida precariamente equilibrado entre a terceira idade e o infantário.
O atraso será rectificado; até lá, o mais importante é manter a calma, e dar o benefício da dúvida a quem teve de lavar a loiça à mão duas noites consecutivas.

Blog Archive