Sunday, February 20, 2011

Deolinda, Bacalhau a pataco.

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Muito antes de a Deolinda se declarar parva já eu tinha concluído que se tratava de um remake, fracote, dos Madredeus. Mas isso agora não vem ao caso.

A canção em voga, "que parva que eu sou", é acima de tudo uma excelente ilustração de como os processos sociais podem ser totalmente incompreendidos.

O "direito ao trabalho" é paulatinamente transformado em "direito ao assalariamento em contrato sem termo", como se fossem a mesma coisa e como se essa fosse a única forma possível de ganhar a vida.
A concepção do trabalho como assalariamento e do assalariamento como um direito, que não se sabe quem poderá garantir, tem sido espalhada por uma geração de políticos que nunca teve que trabalhar para se sustentar fora da redoma dos compadrios partidários.
Traduz a ideia peregrina de que as escolhas que fazemos na vida não têm consequências económicas (isso é economicismo) e devem portanto ser avaliadas exclusivamente no plano da ética. A partir desse ponto é fácil concluir que não há empregos porque quem devia proporcioná-los procede com maldade. Haver ou não emprego parece então estar apenas dependente da vontade e não ter nada a ver com regras económicas que, goste-se ou não (e eu não gosto), são as que estão em vigor.

A insuportável (para a Deolinda) realidade é a seguinte: só nos dá emprego quem pensa vir a ganhar dinheiro com o nosso trabalho (se quiserem podem chamar a isto exploração). A insuportável realidade é que nas economias desenvolvidas parece haver cada vez menos quem esteja interessado em ganhar dinheiro arrendando-nos.
O importante é tentar perceber porque é que tal está a acontecer. Eu tenho uma data de ideias sobre o assunto mas ficam para outra ocasião.

O Estado, enquanto houve dinheiro, foi contratando as pessoas que o sector privado não absorvia. Os resultados disso estão hoje à vista. Esse tipo de solução tem os dias contados (veja-se o que está a acontecer em Cuba onde o Estado alimentou o sonho de garantir o pleno emprego, convertendo toda a gente em funcionários públicos, e agora está a despedir centenas de milhares de pessoas).

Estou inteiramente ao lado daqueles que acham que esta situação de falta de emprego e de precariedade é insustentável.
Mas não faz sentido criar capitalistas em aviário e forçá-los, por decreto, a explorar-nos mesmo que não queiram.
Em suma, necessitamos de um novo modo de produção que funcione noutros moldes, que esteja adequado às tecnologias de hoje e aos meandros da globalização.
Desafio a Deolinda a fazer uma canção sobre isso.

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