O empresário socialista Sobral de Sousa, acusado nos casos da Escola de Condução de Tábua e da mala de dinheiro entregue ao social-democrata António Preto, foi sócio de José Sócrates, Armando Vara e Rui Vieira (dirigente do PS e marido de Edite Estrela) na empresa Sovenco nos anos 90. António Preto conheceria Sobral mais tarde, em 1997, e garante: “Nunca me disse que conhecia Sócrates ou Vara”.
António Simões Costa, fundador do PS/Lisboa, foi o mentor da empresa e explica como nasceu a Sovenco e o que o aproximou dos demais sócios: “Conheci-os nas campanhas do partido e estivemos todos com Guterres”. No ano da fundação da Sovenco, 1989, Sócrates e Vara já eram amigos. E porquê entrar nos negócios? Simões lembra uma conjugação de factores: “Cavaco governava com maioria e os suecos, com quem tinha relações, pediram-me alguém que representasse os pneus Jislaved e as jantes Ronal”. Expresso 14.11.2009
Pode ser que me engane, mas o potencial de danos que Armando Vara pode vir a causar a José Sócrates é bem maior do que todos os outros casos ou pretensos casos que tanto desgastaram a imagem do primeiro-ministro e tão decisivamente contribuíram para a perda da maioria absoluta do PS. Armando Vara (e não a ‘Face Oculta’) tem a capacidade de, por si só, arrastar Sócrates para a queda num poço de que se desconhece a profundidade. Há amizades que matam, quando se misturam com outras coisas que não são misturáveis. Foi José Sócrates quem, em nome da amizade (porque competência ou qualificação para o cargo ninguém a conhecia, nem ele), fez de Armando Vara administrador do banco do Estado, três dias depois de este ter adquirido uma espécie de licenciatura naquela espécie de Universidade entretanto extinta — e porque uma licenciatura era recomendável para o cargo. E foi José Sócrates quem, indisfarçadamente, promoveu a transferência de Santos Ferreira e Vara da Caixa para o BCP, numa curiosíssima operação de partidarização do maior banco privado português, sobre as ruínas fumegantes do escândalo em que tinha acabado o case study da sua gestão ‘civil’.
Manda a verdade que se diga, porém, que estes dois golpes de audácia de José Sócrates em abono de um amigo e compagnon de route político foram devidamente medidos: aparentemente, Sócrates contava com o silêncio e aceitação cúmplice com que toda a classe empresarial e financeira recebeu a meteórica ascensão de Armando Vara aos céus da banca e o take-over do PS sobre o BCP, como se de coisa naturalíssima se tratasse. O escândalo não ultrapassou as fronteiras da opinião pública, de modo a perturbar o núcleo duro do regime. E isso foi um primeiro sinal do nível de promiscuidade aceite entre o político e o económico a que estamos agora a assistir. E, em silêncio sempre, toda a classe empresarial clientelar foi assistindo a uma série de notícias perturbadoras sobre operações bancárias a favor de algumas empresas ou investidores que, por acaso certamente, pertencem ao tal núcleo duro do regime, que goza do favor político da actual maioria.
...Junte-se então um governo cujo primeiro-ministro é dado a companhias comprometedoras, um sistema em que se fundem e confundem o político e o económico, o público e o privado, uma justiça que verdadeiramente se tornou cega e surda, mas não muda, um Presidente da República que se desautorizou a si próprio no pior momento, e um país onde as noções de interesse público e serviço público já quase se perderam por completo sem vergonha alguma, e tudo isto começa já a cheirar indisfarçadamente mal. Cheira a fim de regime e só os loucos ou os extremistas é que podem achar isso uma boa perspectiva para o futuro. Expresso 14.11.2009
No mesmo dia, no mesmo jornal, dois textos imperdíveis sobre a caldeirada política e comercial em que vivemos. Deve ser para nos poupar à total desmoralização que o Presidente do STJ quer destruir as cassettes. Bem haja.
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