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"A turbulência financeira que atravessou o mundo e está longe de se dissipar já provocou a mais completa série de verdades definitivas e sobretudo contraditórias. Têm de comum o disparate e a inabalável certeza dos seus autores. "Marx tinha razão"; "É o fim do capitalismo"; "Acabou a hegemonia americana"; "Nada será como dantes"; "O Estado tem de tomar conta da economia"; "Vão mudar os padrões de consumo"... Em sentido contrário, também temos: "O capitalismo vai recuperar"; "A iniciativa privada vai ultrapassar a crise"; "Vamos refundar o capitalismo"; "A crise gera novas oportunidades de negócio"; "A União Europeia vai liderar a recuperação das economias"... Sem comentários.
Mais uma vez, anuncia-se um "novo paradigma". Não se sabe o que quer dizer, mas é "chique". E misterioso. Mais poder político? Mais supervisão e regulação? Mais justiça? Mais ética? Novos padrões de consumo? Mais Estado? As únicas certezas são o menor crescimento, o desemprego e a redução do conforto. O resto é uma incógnita. Até porque as mudanças de comportamentos demoram décadas. E as mudanças de leis e de instituições exigem políticos e legisladores à altura, com autoridade e legitimidade - o que também é uma incógnita.
A regulação falhou. É o que todos dizem, menos os reguladores. Convinha saber por que falhou a regulação. Os vigaristas têm meios mais sofisticados. Os reguladores, a justiça e as polícias estão atrasados. Estas são as razões superficiais. Mas há outras. Os reguladores e os políticos conhecem intimamente os especuladores e os predadores. Não só se conhecem, como se estimam e convivem. Têm mesmo, simultânea ou sucessivamente, interesses comuns. O triângulo formado pelos políticos, os reguladores e os especuladores constitui um percurso pessoal que muitos fazem airosamente nas suas carreiras. Muitos políticos e muitos reguladores consideram que os predadores e os especuladores têm o direito de se entregar às suas actividades, de operar no mercado livre, de ter sucesso e de vencer nos negócios. Se é verdade que houve Estado a menos, também é certo que Estado a mais não é a resposta. Pois o Estado é... os políticos!
Por uma vez, os políticos deste mundo não parecem ser os principais responsáveis. Mas não estão isentos. Falharam na regulação, na fiscalização e na inspecção. Falharam na justiça, na investigação e na penalização. São, frequentemente, parceiros, cúmplices e amigos dos bilionários e dos predadores. "
António Barreto, Público 21.12.2008
Eu já tinha falado sobre este "Mito da Regulação". Nem mais nem menos estado, talvez outro estado.
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