Tenho lido tudo o que encontro sobre o "Fórum das Esquerdas", que teve lugar ontem, para tentar perceber melhor o seu significado. Não que tivesse à partida grandes ilusões; através da blogosfera e não só, sei o que pensa, e como pensa, uma boa parte dos que participaram como oradores no Fórum.
O que me parece interessante não é a discussão sobre as intenções políticas dos promotores mas sim discernir qual a mensagem ideológica involuntária que foi implícitamente projectada pela forma como foi organizado e realizado este Fórum, sem com isso querer de forma alguma contestar a sua realização.
Trata-se apenas de tentar perceber qual a "identidade" desta iniciativa para melhor avaliar os seus prováveis resultados.
O Fórum foi claramente virado contra o Governo, representado como entidade subordinada aos "interesses económicos" e que, se assim não fosse, poderia resolver a generalidade dos problemas dos portugueses.
Os tais "interesses económicos" não foram endereçados directamente preferindo-se "apertar" com o Governo para os meter na ordem. São quase sempre referidos em termos muito abstractos do tipo "neo-liberalismo", "financeirização", etc.
Omitiu-se a questão das receitas do Estado no quadro do regime actual e a forma como estão dependentes da actividade económica das empresas e da taxação dos salários dos seus trabalhadores.
As relações laborais, na "economia real" das empresas, foram em larga medida subestimadas e não me apercebi de qualquer apelo aos trabalhadores explorados para se movimentarem nas empresas. Aliás penso que esses trabalhadores estariam muito pouco representados no elenco dos oradores (e dos assistentes ?) se exceptuarmos a intervenção "institucional" de Carvalho da Silva.
A generalidade das intervenções foi feita por académicos, professores, médicos e outros funcionários e versou sobre os serviços prestados aos cidadãos pelo Estado. Os cidadãos figuraram assim como receptores passivos dos serviços do Estado, como se os seus interesses se encontrassem suficientemente representados e defendidos pelas classes profissionais que os prestam. Não me consta que tenham sido tratadas as relações de produção nem avançadas quaisquer propostas para a sua transformação com excepção do enquadramento profissional de certas categorias de funcionários públicos (a avaliação dos professores parece ter monopolizado o debate sobre a educação).
Em síntese: sem se apresentar qualquer alternativa para a organização social da produção e consequentes fontes de receitas para o Estado insinuou-se que o Governo podia controlar e limitar a actividade dos privados como entendesse e, apesar disso, proporcionar aos seus funcionários muito melhores condições de trabalho e dessa forma, por arrasto, prestar muito melhores serviços à generalidade dos cidadãos.
Como se o capitalismo estivesse entre parêntesis ou se tratasse de um Fórum Pós-Capitalista.
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