Thursday, July 29, 2010
Fanfarronadas com a golden share
A 2 de Julho, depois de a golden share impedir a venda da Vivo, escrevi uma crónica aqui. Golden share, certa ou errada? Disse: 1) os capitalistas votaram, uns "sim" e outros "não", segundo os seus interesses; 2) o Governo votou "não" porque sendo o seu interesse o do País, havia argumentos nacionais para a PT guardar a ligação ao Brasil. Disse isso, mas acrescentei a hipótese de o Governo - que estivera certo em marcar uma posição - poder ter cometido um disparate financeiro. É que havia gente sábia, como Belmiro de Azevedo (que construiu a Sonae), que garantira: "É muito difícil haver outra oportunidade como esta para vender." E Ricardo Salgado (dono do BES), que dissera que a Telefónica, irritada por não comprar a Vivo, podia comprar a PT toda... Então, golden share, certa ou errada? Escrevi a 2 de Julho: "(...) daqui a dias, se a Telefónica pagar os 7,15 mil milhões já prometidos, a PT não perdeu nada e o Governo marcou uma posição. Se forem menos de 7,15 mil milhões arrecadados, então, o Governo errou. Daqui a dias vamos tirar a limpo." Tiramos a limpo: foram 7,5 mil milhões. E não foi só uma posição afirmada, a portuguesa PT vai mesmo continuar no Brasil. Passei um mês com a dúvida dos ignorantes. Se calhar bom é ter certezas, como Belmiro de Azevedo. Quando fez a OPA à PT disse que ia vender a Vivo à Telefónica. Foi há três anos e era por 2 mil milhões de euros.
Ferreira Fernandes, DN 29.07.2010
Este texto de Ferreira Fernandes condensa a maior parte dos equívocos que, desde ontem, se têm acumulado sobre o significado do negócio PT/Vivo/Ói.
Sócrates tem tido o desplante de insinuar que a golden share teve "um papel essencial na obtenção desta grande solução".
1. É verdade que a Vivo foi vendida por 7,5 mil milhões em vez de dos 7,15 anteriores à golden share. Mas também é verdade que os 7,5 mil milhões de agora vão ser pagos durante mais de um ano e os 7,15 mil milhões de há um mês eram a pronto. A diferença é portanto muito menor do que parece.
Seja como fôr essa diferença é dos accionistas e não do Estado português.
2. O braço de ferro iniciado pela golden share, e mantido durante semanas, inflaccionou provavelmente o preço de compra da participação na Ói. O BPI considera que o impacto do acordo é "positivo", embora afirme que, no caso da Oi, a PT vai pagar um "valor elevado por uma posição minoritária sem controlo accionista ou com controlo partilhado".
"Segundo os nossos cálculos, a posição que a PT está a adquirir vale 1,2 mil milhões de euros em valor de mercado, o que implica um prémio de 2,5 mil milhões de euros", acrescenta o BPI na nota hoje enviada aos investidores.
3. A entrada da PT na Ói sempre esteve disponível e para ser realizada não dependia da intervenção de Sócrates e da sua golden share. Quando muito poderá dizer-se que Sócrates exerceu a golden share contra os accionistas da PT (admitindo que eles queriam dar outro destino ao capital obtido pela venda da Vivo) e não contra os espanhóis da Telefónica como ele tentou fazer crer para efeitos eleitoralistas.
Em suma, o Estado português expôs-se ao ridículo na cena financeira internacional , invocando o "interesse nacional" em vão, em troca de nada. A Vivo acabou mesmo por ser vendida e a PT é agora um actor secundário na Ói.
Ao contrário do que pensa Ferreira Fernandes, o Governo nem sempre actua em nome dos interesses do país. Neste caso, pondo-se em bicos dos pés com a golden share, o que pretendia era escapar à derrota eleitoral que se perfila no horizonte.
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