O programa da televisão pública Os Grandes Portugueses teve no Domingo à noite a sua conclusão lógica. A Direcção da RTP I, que foi desenterrar Maria Elisa para fazer este programa, pensava ter um grande êxito entre mãos, com grandes audiências e muitos falsos confrontos para entreter o pagode. Nunca provavelmente admitiu que isto lhe corresse tão mal.
O programa politizou-se e neste marasmo anestesiante que é a vida política portuguesa eis que lhe sai na rifa em 1º lugar o Salazar e em 2º, o Álvaro Cunhal. Os heróis do bloco central: Mário Soares e Sá Carneiro são preteridos e as figuras sempre disponíveis da nossa história: D. Afonso Henriques, Infante D. Henrique, D. João II, Vasco da Gama, etc., são relegadas para segundo plano. Os mais inconvenientes, os menos politicamente correctos, surgem em força. Resolve fazer uma sondagem à pressa para saber quem era o grande português e lá safa a honra do convento descobrindo que o escolhido era D. Afonso Henriques. A sondagem sempre valia mais do que os telefonemas a 1,00 € cada.
Todo este espectáculo foi de uma grande tristeza, exceptuando talvez alguns dos documentários que tinham dados informativos sobre os biografados.
Os Grandes Portugueses não passam de uma versão intelectual do Big Brother, com heróis e vilões, o vencedor e os despedidos da casa (veja-se um dos episódios do Gato Fedorento - Isto é uma Espécie de Magazine), tudo isto apresentado com grandes pretensões culturais e pedagógicas. De cultural tem muito pouco e é o mais anti-pedagógico possível. Mas a RTP, na senda das suas congéneres estrangeiras (não estamos na Europa?), resolveu mesmo assim apresentar este programa e acrescentou-lhe a apresentadora menos classificada para o fazer. Não quanto as suas capacidades profissionais, quem sou eu para discutir isso, mas quanto ao seu comportamento político. Quem já mudou tantas vezes de casaca: de assessora de imprensa de Maria de Lurdes Pintassilgo, a directora de programas de Proença de Carvalho, que tinha a missão, já publicamente assumida pelo próprio, de sanear a extrema-esquerda da televisão, de deputada por Castelo Branco pelo PSD a adida cultural em Londres, não era de certeza a pessoa mais indicada para dar um tom de seriedade ao programa, que, como se veio a verificar, acabou na desgraça que foi. Maria Elisa rodeou-se de pessoas mediáticas, mas pouco classificadas, com as raras excepções do Hélder Macedo e talvez, não sou pessoano, de Clara Ferreira Alves. A escolha de Odete Santos foi nitidamente para matar pela segunda vez o Álvaro Cunhal.
Além do mais, Maria Elisa levou o programa a sério, apesar de ir sempre dizendo que era um passatempo. Escolhe primeiro os que lhe dariam prestígio intelectual, como o Professor Eduardo Lourenço no debate de apresentação, mas combate e afasta depois todos os que o ridicularizavam. Reúne-se com aqueles que podiam atacar o Cunhal e, mais moderadamente, o Salazar. Ainda na noite de Domingo, a seguir a duas intervenções da tresloucada Odete Santos, achou por bem, o que não fez com nenhum outro interveniente, contrapor à opinião daquela deputada a de um historiador (António da Costa Pinto) e a de um jornalista (José Manuel Barroso), este último que sempre se notabilizou pelo seu anticomunismo militante e que achou, em artigo que escreveu recentemente para o Diário de Notícias, que Salazar ainda vá lá que fosse escolhido, agora Cunhal é que nunca.
A RTP teve pois o que merecia e os portugueses o que na sua maioria não desejavam, mas que, dada a sua tolerância para com o fascismo, agora apodado de Estado Novo, tiveram que engolir.
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