Porque é que - perguntam amigos, familiares e carteiros preocupadíssimos - eu teimo em submeter-me a certas séries televisivas? Poderia responder-lhes com uma citação do Antigo Testamento, mas é mais fácil explicar que ainda está para surgir um artefacto audiovisual que inclua vulcões, tornados ou ondas gigantes incapaz de suster a minha atenção. Pompeii chegou mais perto do que qualquer outro; três minutos de um inacreditável prólogo filmado com filtros de lente que levariam um produtor de soft-porn italiano dos anos 80 a uma indignada apoplexia seriam provavelmente suficientes para vocês, mas eu Provérbios 12:16, etc, etc, etc.
A única virtude da série é ter providenciado a mais veemente convergência entre forma e conteúdo desde que Kerouac escreveu num rolo de papel higiénico: depois de Pompeii, a expressão filme-catástrofe nunca mais vai ser a mesma. O fosso entre tragédia colectiva e individual é talentosa e originalmente transposto; os planos e os diálogos vão-se acumulando numa maré fumegante, descendo encosta abaixo na nossa direcção; e não há nada que o telespectador possa fazer, a não ser enrolar-se no mármore gelado da sala-de-estar, em posição fetal, à espera de ser sepultado em entulho vesuviano. Alguém me convide para jantar hoje à noite (segundo episódio), se faz favor, ou os turistas de um futuro longínquo terão a oportunidade de visitar a margem sul em busca dos meus restos mortais, ainda com o telecomando e um pacote de maltesers nas mãos petrificadas.
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