O “Manifesto Mérito e Sociedade” (MMS) é o documento em cuja base Eduardo Correia pretende formar um partido politico e concorrer às eleições de 2009. (Pode ser consultado em http://www.mudarportugal.org/).
Apresenta um formato híbrido, entre o programa eleitoral e a declaração de princípios, o que o torna algo desequilibrado: uns pontos com grandes detalhes de implementação (caso do e-government) e outros muito genéricos e superficiais (caso da educação).
Não questiona as bases económicas nem politicas do sistema e da organização da sociedade.
Eduardo Correia situa-se num sistema capitalista com um governo do tipo democracia representativa; orienta-se pelo princípio liberal do Estado como agente regulador e não promotor ou interventor; e principalmente considera que a administração do País devia seguir as regras de gestão eficaz e as boas práticas que regem o mundo empresarial.
O que, se pensarmos bem, tem uma certa lógica, uma vez que adequa a gestão do Estado ao modo de produção sobre o qual está organizada a sociedade.
Deste ponto de vista, os regimes políticos da área da Social-Democracia sofrem de uma contradição de base que ajuda aliás a explicar as suas progressivas dificuldades.
Fica pois assente que Eduardo Correia não pretende fazer mudanças radicais, apenas acha que isto pode funcionar melhor.
Uma linha comum ao longo dos capítulos que tratam as várias áreas da governação e da sociedade é a procura de uma alteração de valores: emparelhar direitos com responsabilidades, estabelecer uma cultura do mérito.
Logo no 1º Capítulo, e à laia de apresentação dos princípios orientadores, se diz:
“È necessária uma profunda mudança nos seguintes aspectos:
- Comportamentos individuais
- Comportamentos colectivos
- Organização da sociedade
- Papel do Estado
- Sistema social, económico e politico”
Há que referir que a grande parte do conteúdo do documento é sobre comportamentos; alguma coisa é sobre o papel e a organização do Estado e da Administração; e nada sobre o Sistema.
Quem pretende uma mudança de atitude tão grande, direi mesmo uma mudança de paradigma cultural, tem obviamente que dar grande importância à Educação. E ele diz que dá! Mas parece ficar-se apenas por dois ou três chavões e alguns slogans na moda, desligados da realidade.
Por exemplo, a preocupação com o “abandono escolar” e a “necessidade de prolongar o ensino obrigatório até ao 12º ano”.
Dizer isto em abstracto, ignorando que há em Portugal uma grande separação entre a escola e a vida económica e social e que a escola é mantida a funcionar em circuito fechado por uma gestão centralizada e desligada das realidades, não é de bom augúrio...
Entre as propostas concretas, Eduardo Correia apresenta algumas ideias que me apetece salientar como interessantes e criativas:
a) a “Loja do Cidadão” para a Justiça, a que o autor chama Tribunal do Cidadão, para que qualquer pessoa pudesse, no mesmo espaço, obter aconselhamento jurídico e pedir apoio judiciário (se aplicável) para qualquer tipo de questão, dirigindo-se especìficamente aos “balcões” aplicáveis ao seu caso (trabalho, família, etc) Os funcionários desses “balcões” seriam advogados da Ordem ou juristas nomeados oficiosamente.
b) os “processos on-line” na área da Saúde, com um portal onde existiriam entre outros, os seguintes conteúdos informativos:
- contactos úteis
- mapas e descrição do percurso a fazer para encontrar unidades de
saúde, organizações de apoio à saúde e associações de doentes
- enciclopédia médica com informações sobre doenças, exames,
medicamentos
- tempos e listas de espera para cirurgias e tratamentos mais comuns
- exposição dos direitos dos doentes: garantia de cuidados, taxas
moderadoras, liberdade de escolha, reclamações, etc
- marcação e desmarcação de consultas
Em conclusão, no MMS fala-se sobre todos aqueles aspectos que a generalidade dos cidadãos que reflectem sobre a nossa sociedade pensa que estão mal: justiça, educação, saúde; peso do funcionalismo publico e da burocracia; promiscuidade entre administração e Partidos, etc. E avançam-se ”soluções”.
Não se pense que eu acho isto mal. Ser “politico de bancada” é provavelmente um bom treino de cidadania. Eu pessoalmente farto-me de praticar!
Mas isto é capaz de ser pouco para justificar a criação de outro partido. Principalmente porque os seus princípios não diferem em quase nada do que outros têm proclamado e as medidas apontadas são em grande parte as que os últimos Governos anunciaram. O “busílis” não está no enunciado mas sim no levar à prática. E quanto a isso Eduardo Correia não nos diz nada.
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