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Na continuação de um post anterior sobre o mesmo tema, O Google contra Marx (1), voltamos para desenvolver um pouco mais a compreensão do modelo de negócio Google.
À primeira vista o modelo de negócio do Google parece idêntico ao dos media tradicionais; captação de receitas de publicidade atraídas pelas garantias de audiências dadas aos anunciantes, com base na disponibilização, por vezes gratuita, de informação. Mas essa semelhança é ilusória pois o Google não disponibiliza um determinado bloco finito de informação; em vez disso proporciona aos seus utilizadores, que são os destinatários da publicidade, uma ferramenta com a qual podem aceder às mais variadas informações, ao sabor de propósitos pessoais e particulares.
Ao contrário da publicidade dos grandes meios de difusão, como as televisões que também alcançam milhões de espectadores, a publicidade do Google não é igual para todos os destinatários como acontece com um spot televisivo. Cada utilizador do Google recebe publicidade específica de acordo com os interesses e perfil que a sua utilização do Google revela.
Em certo sentido o negócio do Google é mais parecido com qualquer aluguer de ferramentas ou de veículos. Pode-se estabelecer a analogia com um aluguer de automóveis dotados de GPS, sem outro custo para o utilizador que não fosse o de levar o rádio sempre ligado e fazer a condução ao som de anuncios publicitários. O condutor podia portanto levar o automóvel pelas estradas que entendesse pagando para o efeito a gasolina necessária (como paga a energia e os serviços de rede que permitem ao seu computador executar pesquisas no Google).
O negócio descrito atrás nunca seria viável por causa do custo do automóvel comparativamente com as verbas que os anunciantes estariam dispostos a pagar para influenciar as preferências de consumo de uma só família. Ao invés os custos da ferramenta que o Google "aluga", que são enormes, permitem influenciar não uma mas centenas de milhões de famílias e empresas. As "estradas" a que essa ferramenta dá acesso, as informações indexadas pelo Google, foram criadas gratuitamente pelos próprios cidadãos e pelas empresas.
A figura publicada no topo deste post mostra a diferença entre o esquema de valor tradicional e o esquema próprio do Google. No primeiro caso, a partir de capital constante (maquinaria, instalações, matérias primas, etc) e de capital variável (trabalho humano) obtém-se um determinado "valor de uso" que o vendedor cede ao comprador com base no "valor de troca". O esquema típico do Google parte apenas de capital constante (o hardware onde reside o repositório de indexação e o software de armazenamento e pesquisa) já que não há trabalho específicamente envolvido no atendimento das "encomendas" (os próprios anúncios publicados pelo Google são quase sempre comprados em regime de "self-service").
O Google produz "valor de uso" para três tipos de intervenientes:
a. os que acedem à informação com base no repositório de referência do Google
b. os que publicam e difundem informação através da referenciação pelo Google
c. os que pagam para aumentar a probabilidade de ser vistos nos acessos à informação proporcionados pelo sistema de referenciação
É forçoso constatar que os intervenientes do tipo c., uma minoria portanto, pagam o suficiente para manter a gigantesca infraestrutura do Google e garantir à empresa uma invejável rentabilidade.
O grosso do "valor de uso" disponibilizado pelo Google é entregue à sociedade que nada paga por ele. Trata-se de uma situação sui generis pois o "valor de uso" só numa pequena parte é cedido de forma onerosa, o que não encaixa no modelo de análise forjado por Marx.
A extensão do repositório do Google e a sua dimensão geográfica, a intensidade da sua utilização e a variedade de consequências que a sua utilização arrasta são verdadeiramente incomensuráveis. Quando oiço criticar o Google, com base em supostos perigos ou no excesso dos lucros, sou levado a pensar que a maioria de nós nunca pensou no valor proporcionado à sociedade pelas ferramentas que ele nos tem facultado.
Mesmo que involuntáriamente esta actividade empresarial do Google tem uma dimensão social enorme. É difícil, é mesmo impossível, imaginar tudo aquilo que teríamos perdido se o Google não tivesse sido inventado.
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