Wednesday, October 31, 2007

Ouvir vozes



É minha opinão formada - desde há muitos, muitos anos - que não há nenhum problema doméstico que não possa ser resolvido ouvindo calmamente a faixa 2 deste álbum. Testem a validade desta teoria da próxima vez que a máquina de lavar vos inutilize sete t-shirts sem qualquer justificação.

Falando nos meus alunos...

...é meu aluno o rapaz que, no último domingo à noite, no Gato Fedorento resolveu em directo o famoso cálculo dos seis por cento do PIB, que em tempos atrapalhou António Guterres. Não fui eu que lhe ensinei. Vai longe o rapaz. É de Matemática. Por que raio pus eu a etiqueta "LEFT" neste texto?

SPD alemão adopta socialismo democrático para vencer o efeito da tosta mista


Congresso em Hamburgo fortaleceu veia esquerdista de sociais-democratas, que partilham poder com Merkel.

O Partido Social-Democrata alemão (SPD) aproveitou o último congresso, realizado anteontem em Hamburgo, para renovar a sua imagem: elegeu como meta a luta por um "socialismo democrático", adoptando um discurso com ingredientes tanto de esquerda como ecológicos, refere a Deutsche Welle. Tendo em vista as eleições de 2009 - e o escoamento de eleitores desiludidos para A Esquerda -, os congressistas ratificaram um programa político para substituir o antigo documento do SPD, aprovado há 18 anos, pouco antes da queda do Muro de Berlim.
Houve ainda outro sinal de mudança nas directrizes do mais antigo partido alemã: os sociais-democratas fizeram, de acordo com o Deutsche Welle, uma série de "ataques disparatados" à União Democrata Cristã (CDU), cujos membros partilham o poder em Berlim com os sociais-democratas em regime de coligação. O líder social-democrata Kurt Beck chegou mesmo a acusar o partido de Angela Merkel de esconder uma essência de "radicalismo de mercado" por detrás de "uma máscara social-democrata".
Angela Merkel recebeu com alguma irritação a nova meta do SPD. "Não precisamos de um retorno ao socialismo, como querem os sociais-democratas, já tivemos socialismo que chegue na Alemanha Oriental", afirmou a chanceler, citada pela Deutsche Welle.
A expressão "socialismo democrático" é usada "várias vezes" ao longo do novo programa partidário, um texto de 28 páginas que vem atirar o antigo para as prateleiras da antiga RDA, uma vez que o referido documento foi ultimado e aprovado pouco antes da reunificação germânica. A nova expressão no léxico social-democrata é vista como uma viragem à esquerda, mudança que analistas políticos vêem como uma estratégia para reconquistar os eleitores que migraram para A Esquerda, o novo partido no cenário político alemão.
Em entrevista à Deutsche Welle, o politólogo social-democrata Thomas Meyer não vê a fuga de militantes para novos partidos como uma ameaça democrática. "Fica só um pouco mais difícil criar um governo, mas o Estado em si não fica mais fraco", observa o cientista político da Universidade de Dortmund.
Além do desafio de formar governos viáveis através de coligações, os grandes partidos têm agora o ónus de redesenhar a sua própria identidade política à medida que vêem as suas bases esvaziarem-se. Encabeçado por Kurt Beck - um líder que não consegue sair da sombra da chanceler alemã -, o SPD parece estar a ser vítima do efeito da tosta mista: encontra-se prensado entre a CDU de Merkel (que adoptou posturas de esquerda e, ao mesmo tempo, chamou para si posturas neoliberais próprias do SPD) e A Esquerda (fundado pelo dissidente Oskar Lafontaine, ex-presidente do SPD, que repescou antigas ideias sociais-democratas).
"Espremido entre os dois, o SPD não conseguia mais afirmar as próprias posições", diagnosticou o politólogo Thomas Meyer.
Os sociais-democratas tentam agora ser eles próprios sem parecer que estão a copiar os vizinhos e, ao mesmo tempo, procuram transparecer um cariz ecológico (propostas para a redução de emissão de gases) e social (em caso de privatização da companhia ferroviária Deutsche Bahn, por exemplo, defendem que 25,1 por cento das acções sejam "do povo").
Partido liderado por Kurt Beck está entalado entre a CDU e A Esquerda, a formação fundada por Oskar Lafontaine

Público 30.10.2007, Andréia Azevedo Soares

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Contra todas as espectativas a Alemanha parece querer competir com a Itália no que toca à comicidade política. Depois da "esquerda caviar" só nos faltava agora a "esquerda tosta mista"...

Ah! Uma corrente!

Finalmente alguém me passa uma corrente dos blogues! Daquelas que todos os blógueres passam uns aos outros! Nunca ninguém me havia passado uma! Julguei que ninguém me ligasse nenhuma. Quem ma passou foi o bacano do João Gaspar.
Pegar no livro que está mais próximo, abrir na página 161 e transcrever a quinta frase completa dessa página. No meu caso, o livro mais próximo de onde me encontro é o livro de texto da cadeira que neste semestre lecciono, Introdução à Programação em Mathematica, de Amílcar Sernadas et. al.. Na página 161 pode ler-se
Na programação funcional, tal como na programação recursiva, não é usado qualquer construtor imperativo (i.e., não se pode recorrer, nomeadamente, nem à composição sequencial de acções, via ";", nem a comandos iterativos While), assim como não se recorre à memorização de valores em variáveis através de atribuições.
Passo a corrente ao João André, ao Francisco Frazão, ao Rui Curado Silva (quando voltar de viagem ou por que não antes?), ao Nélson, ao André Abrantes Amaral, ao Leonardo Ralha (a ver se volta a activar o blogue) e ao circunspecto Hugo Mendes (homem de muuuuuitos livros).
(João Gaspar, olha que tenho alunos que gostam da praxe; acho que os vou chumbar. Estou a brincar. Obrigado e até à próxima corrente.)

Tuesday, October 30, 2007

Para acabar de vez com a praxe

Não adianta nada desdenhar dos alunos que participam voluntariamente na praxe sem compreender que, na sua maioria, são alunos deslocados que estão sozinhos numa cidade nova e, para eles, desconhecida, sem amigos ou família. A praxe é, porventura, a única socialização possível. Mas não deixa de ser um hábito humilhante e – mantenho – provinciano. Se se quer circunscrever este hábito a quem queira legitimamente participar nele, há que fazer primeiro com que não seja a única alternativa de socialização disponível. É aqui que as faculdades devem actuar. E está visto que não basta deixar o assunto entregue às associações de estudantes, embora estas possam desempenhar um papel importante, desde que não sejam comandadas por indivíduos com traje académico que julgam que ser estudante universitário lhes dá um estatuto especial.
Para encerrar este assunto recomendo a leitura de dois interessantes e esclarecedores comentários ao meu texto anterior, pelo João André e pelo Tárique. A ambos agradeço.

Monday, October 29, 2007

Contra a verdadeira pobreza






Sou pouco dado a "peditórios" mas fui tocado por estes cartazes da PEOPLE IN NEED contra a pobreza enviados por mão amiga.

A praxe e o provincianismo

Ainda voltando ao tema do texto de há um mês atrás (que registou o recorde de comentários neste blogue), mas para recomendar a leitura de um comentário deixado por um dos mesmos veteranos da LEIC, só que desta vez no blogue do MISTA. Vale a pena ler:
"caros estudantes do técnico. até há poucos anos não se via ninguém do técnico de traje. perguntem a quem quiserem, nunca houve essa tradição, aliás nunca houve praticamente em toda a academia em lisboa."

Não sei se tens noção (pelos vistos não) que toda a gente em Lisboa tem noção disso. E é precisamente por isso que todos nos empenhamos em trazer a tradição académica para Lisboa. Se tu julgas que isto é uma tradição "recém-inventada tradição", cópia da "rasquice alheia" e é a causa de o técnico ser "uma merda igual às outras", tenho pena de ti porque não percebes nada disto.
Pela minha experiência pessoal, um aluno em Lisboa que seja adepto da praxe não pode ser lisboeta. Nenhum aluno lisboeta se quer sujeitar a essas figuras; só os de fora de Lisboa. Daí o referido (e eloquente) “querer trazer” a praxe da província para Lisboa. (Os meus leitores de fora de Lisboa que são contra a praxe que me desculpem o “província”; uma boa definição de “provincianismo” é ser a favor da praxe, mas tal não significa necessariamente ser-se de fora de Lisboa. A implicação oposta talvez seja verdade.)
Mas há um pormenor importante: tipicamente um aluno de Lisboa, em Lisboa, não é deslocado, isto é, vive com os pais. Um aluno deslocado acabou de sair de casa e quer “emancipar-se”. Participar na praxe, seja para se submeter ou submeter os outros, pode ser visto como parte dessa “emancipação”. Seria necessário saber o comportamento dos alunos lisboetas deslocados fora de Lisboa, e eu não sei. Mas há outras razões para a minha desconfiança: pessoas que eu conheço e considero civilizadas, tendo estudado no Porto e em Coimbra nem por isso se furtaram a usarem o “traje académico”.Até prova em contrário, portanto, continuo convencido de que a praxe é mais uma manifestação da famigerada “regionalização”. Atente-se neste episódio digno do mais típico “espírito académico”.

A Outra Margem


"A Outra Margem" de Luís Filipe Rocha apresenta-se assim:
Um "travesti" que perdeu o gosto pela vida é confrontado com a alegria de viver de um adolescente com síndrome de Down. Filme que pretende iluminar e exibir a humana normalidade dos "anormais", A Outra Margem propõe uma ponte de compreensão entre as duas margens.
O trabalho dos actores é excelente e os ambientes criados são muito conseguidos e verosímeis.
O diálogos são bons e "falam" só quando necessário.
O problema é que a história, que começa muito forte, vai perdendo força e agoniza na previsibilidade e nos bons sentimentos. Uma incursão sem chispa pelo mundo das diferenças.
O filme não surpreende nem desafia o espectador. Não se leva um murro no estômago e sai-se da sala demasiado em paz com a vida.
"A Outra Margem", que não é alcançada, podia ter sido um grande filme.

A melhor da semana passada - 11

QUENTES E BOAS, MAS AGORA TODAS HIGIÉNICAS
DN, 27 de Outubro 2007


É o Outono que traz os vendedores de castanhas, ou são os vendedores de castanhas que chamam o Outono? Este Verão tardio está a custar a acabar e não convive bem com os primeiros alfinetes de frio outonais. Nem com as castanhas assadas. Quem é que já ouviu falar em comer castanhas assadas quando o termómetro ainda insiste em trepar até aos 25 graus, e o sol força a despir o blazer, o casaquinho de malha, o blusão de marca, a mudar o passo do lado luminoso da rua para o lado da sombra, a começar a dar ouvidos aos matracas do aquecimento global?

Castanhas assadas pedem friagem a apetecer abafo grosso, céu cinzento a pensar em pôr luto, vento daquele que nos pega à traição nas esquinas, aguaceiros de guerrilha, ora chove a potes ora deixa de chover, conversa fiada de transporte público sobre tirar os pulôveres da gaveta, limpar o pó aos radiadores, experimentar o edredão de penas novo, o escuro que já faz quando se sai do emprego, a vontade de chegar depressa a casa em vez de ficar a flanar nas esplanadas.

Tudo a fazer rima com as castanhinhas saídas do assador de barro do carro escalavrado do vendedor e embrulhadas num molho de folhas das Páginas Amarelas, mesmo assim ainda a aquecer-nos as mãos através do papel, até nos faz esquecer do preço que sobre de um Outono para o outro. Tanto poeta que fez versos com tanta gente e a tanta coisa em Lisboa, das varinas aos vendedores ambulantes, dos donos de tabacarias aos estivadores, e não houve nenhum que se lembrasse do assador, do carro, das castanhas e das páginas das listas telefónicas? É que agora já é tarde de mais.

Este Outono, Lisboa perdeu os carros com a chapa a pelar, os assadores fumarentos, o cartucho denso de nomes e números de telefones de lisboetas a acomodar as castanhas. Porque assim o decidiu a Câmara Municipal, e porque parece que é mais higiénico, mais moderno, mais vistoso e mais europeu, os carros das castanhas passaram a ser todos artilhados de inox e até faíscam quando o sol lhes bate em cheio; e as listas de telefone tão amigas das castanhas foram substituídas por uns sacos de papel com dois compartimentos, um para as castanhas que ainda não se comeram, outro para as cascas das que já foram comidas.

Dizem que assim as mãos já não ficam tão sujas e as ruas vão ficar mais limpas, francamente não sei. No saco lê-se: "Castanhas: mantenha a tradição" (eu preferia ler como dantes: Casa de Pasto Adega dos Lombinhos, R. Dourad, 218 864 887, ou A Reparadora Vidreira, Ger. R Grilo, 218 610 190, foi assim que descobri quem me emoldurou os quadros cá para casa durante bastante tempo, é verdade), mas tradição, agora, parece que só mesmo as castanhas em si, "quentes e boas" como dizia o fado, porque já mais ninguém o diz. É o Outono que traz os vendedores de castanhas, ou são os vendedores de castanhas que chamam o Outono? Este ano, um veio com calor ainda agarrado, e os outros a empurrar carros frios de inox.
Eurico de Barros

Sunday, October 28, 2007

De modo a abalar as raízes

O Filipe Guerra teve a amabilidade de me passar, de sua livre e espontânea vontade, um desses sempre úteis memes blogosféricos. Isto é bom: escolher o livro mais próximo, abri-lo na página 161, e transcrever a quinta frase completa. O jogo toca-me particularmente pois, como se lembrarão os leitores mais atentos, foi assim que escolhi o nome do blogue: abrindo aleatoriamente o livro que tinha em cima da secretária e lendo a primeira palavra que me apareceu (o livro, felizmente, era um dicionário da Porto Editora e não Os 120 Dias de Sodoma).
Dada a conjuntura kármica da Margem Sul, era quase inevitável que o livro mais próximo neste preciso momento não chegasse às cento e sessenta e uma páginas. Caso chegasse, a página em questão teria certamente apenas quatro frases. A paginação de Truques do Jardineiro, das edições Girassol (não percebo nada de jardinagem e horticultura) termina ao número 93.
Por sorte, o livro imediatamente abaixo na pilha (sim, há uma pilha, eu não percebo mesmo nada de jardinagem e horticultura), o seminal Culturas Hortículas 1, de Alberto e Nydia Gardé, permite-me cumprir as instruções específicas da corrente. A quinta frase da página 161 é a seguinte: «Outra prática aconselhada para os repolhos e couves de Milão consiste no corte parcial do sistema radicular com a enxada ou na incisão anelar do caule, com um canivete, ou de forma mais atenuada, em tombar forçadamente as plantas de modo a abalar as raízes».
Creio não ser o único a achar esta "prática aconselhada" de uma brutalidade algo excessiva. Eu sou um rapazinho metropolitano: quando senti que os meus repolhos de Milão precisavam de ter as suas raízes questionadas, o meu primeiro impulso foi convidá-los para um café e um brandy no aeroporto da Portela (enfim, comigo funciona).
Fica, de qualquer forma, a informação, para os muitos leitores que decerto se defrontam com problemas semelhantes. Passo a corrente ao Julinho, ao major, ao Daniel do b-site (sempre foste às corridas em Kempton?), e a qualquer pessoa que ande a ler o Horticultura Prática, de A. Fersini.

Saturday, October 27, 2007

O falso problema que está na moda

Já não posso ouvir perguntar ao Sócrates se vai ou não fazer um referendo sobre o "Tratado de Lisboa" e depois ouvir a lenga-lenga do Sócrates que diz sempre que só depois da aprovação, em Dezembro, tomará posição.
Acho inacreditável que isto se tenha tornado o centro da discussão política nacional. Não há cão nem gato que não se pronuncie sobre a matéria.
É caso para perguntar:
- acham que um referendo sobre um texto enorme e inextrincável vai arrastar multidões para as urnas de voto ?
- acham que esta consulta é que redimiria todos os erros anteriores e traria o tão ansiado apoio popular à integração europeia ?
- acham que os nossos problemas, em Portugal, resultam de ninguém nos ter "referendado" aquando das várias alterações à Constituição da República Portuguesa ?
Deixem-se de hipocrisias e de querer usar o povo para justificar a chicana política.
Resolvam os problemas dos europeus e não incomodem o povo que tem mais que fazer.

Skip



(Um vídeo que é uma espécie de Painéis de São Vicente do blues, e que, por si só, serviria para justificar o YouTube, a Internet e até a civilização ocidental. Se eu calculasse publicamente o número de horas da minha vida que passei a ouvir Skip James, o mais provável era ninguém acreditar. E os gajos que estão ali de volta dele também não eram nada maus.)

Isto é um post do Terra Habitada

«Acrítica litrária (a partir de Ana Tureza do Mal)

A crítica literária de Pedro Mexia, raramente perfuntcória, é mesmo, quando adrega, de excepção.

A clítica hebdomadária em que o Pedro mexia, nuncamente mictória, é, mesmo quando aborrega, tão-balalão.

A mítica consuetudinária de tetraedro que chia, levemente inglória, é mesmo, quando escorrega, para o Cazaquistão.

A críptica quaternária do cedro em abulia nimiamente excretória é mesmo ao mando brega do capitão.

A política de secretária em que medro de dia (mente notória) a esmo pensando numa esfrega ao setentrião.
»

Hoje fartei-me de trabalhar aqui no blogue (acima de tudo porque não encontrei um único multibanco com dinheiro)

Os links para os blogues do maradona e da Laura Abreu Cravo foram actualizados, reconhecendo a sua nova filiação no Sapo (espero que isto não seja o princípio de uma sangria; não tenho nada contra o Sapo, mas, ok, tenho, tenho uma carrada de coisas contra o Sapo). Há também um linque para o Terra Habitada, um blogue quase inacreditavelmente bem escrito, e que era talvez o último blogue quase inacreditavelmente bem escrito que eu ainda não conhecia. Reparem onde o enfiei, na listinha ali do lado, entre a Ana de Amsterdam e o Samuel Úria: julgam que foi por acaso? O Gattopardo, o novo blogue do Mexia e do Lomba, será adicionado assim que conseguir descobrir um anagrama para a expressão "o novo blogue do Mexia e do Lomba". Estive muito perto, tendo chegado a "vi logo o bom exame ao duodeno", mas sobravam-me duas pérfidas consoantes. Também não se pode pedir muito mais a um cérebro formado em duas escolas que não vão além da centésima octogésima sétima e ducentésima nonagésima posições, segundo a lista do JN.

Thursday, October 25, 2007

Excelentes debates

Assisti a várias boas palestras no primeiro dia da conferência Gulbenkian "Is Science Near Its Limits?". Mas o melhor do primeiro dia só eu e mais uns poucos privilegiados pudemos assistir: um debate entre Luis Alvarez-Gaumé, Dieter Luest (a defenderem as teorias de supercordas) e Peter Woit (a atacá-las). Em breve espero poder divulgar mais sobre este debate. Hoje é o segundo e último dia.
Outro excelente debate ocorreu recentemente entre o Rui Tavares e o João Miranda, nos (mais de 100) comentários a este texto do João. Vale a pena ler os comentários e seguir o debate, sobre as polémicas declarações de James Watson e tudo o que se lhes seguiu. Altamente recomendável. Também espero abordar este assunto, mas só para a semana que vem.

A ciência terá limites?

Hoje e amanhã vou andar por aqui, na Fundação Gulbenkian. Há debates imperdíveis, como o de hoje à tarde: A teoria das cordas e o paradoxo da não-verificabilidade. Sobre este assunto, sugiro as seguintes leituras:
  • String theory is losing the public debate, por Sean Carroll;
  • Some elementary myths about quantum gravity, por Lubos Motl;
  • as recomendações desta página, no item La faillite de la théorie des cordes?
Finalmente sugiro ainda a audição de um debate semelhante ao de amanhã à tarde na Gulbenkian, que teve lugar em Junho na Cité des Sciences em Paris.
Este é um debate da maior importância, que tem vindo a ocorrer um pouco pela Europa e EUA, e que finalmente chega agora a Portugal.

Wednesday, October 24, 2007

O Lobo e o Cordeiro motorizados no país de Kafka


“Pois se não foste tu, foi o teu pai!”, concluía o Lobo para o Cordeiro, junto ao riacho. E assim dizendo, comeu-o.

Era assim que pensava o Lobo na fábula de La Fontaine. E pelos vistos é assim também o entendimento da DGCI e da DGV em relação aos antigos donos dos automóveis cujos novos proprietários não fizeram o registo em seu nome.

A partir de Janeiro de 2008, com o novo imposto de circulação (UIC) substituto do “selo do carro”, a DGCI prepara-se para exigir o pagamento ao cidadão cujo nome esteja no registo.
Mais ainda, a DGCI prepara-se para não aceitar a liquidação do imposto do actual veículo de qualquer cidadão se ele não pagar também o(s) do(s) outro(s).

O cidadão poderia cancelar o registo, mas para isso a DGV exige-lhe os documentos do carro... que ele já não tem!
O cidadão pode requerer a apreensão do veículo por circulação ilegal. Mas parece que a DGCI não aceita o comprovante desse pedido...
Resta ao cidadão rezar muito para que o veículo seja parado numa operação stop e que o policia se lembre de validar a identidade do condutor com a do proprietário e verificar se há um pedido de apreensão sobre o veículo. Ou então jogar todas as semanas no Euromilhões; tem mais probabilidades de ganhar e sempre dá para ir pagando os impostos aos outros.

O mais curioso é que a responsabilidade legal pela transferência de propriedade de um veículo sempre foi do comprador e não do vendedor!
Sou uma normal cidadã sem especial preparação jurídica. Mas parece-me que chega o bom senso para ver que não pode um cidadão ser responsabilizado pelo facto de outro (de quem não é fiador, nem tutor, nem representante) não ter cumprido a sua obrigação legal!
E também que não deve ser legal a DGCI não aceitar o pagamento do imposto de um veículo só porque ainda há um “fantasma” em nome do mesmo proprietário!

Li no ultimo numero da revista do ACP um artigo sobre isto que me deixou chocada!
Limitava-se a carpir sobre o problema e só faltava aconselhar os automobilistas a fazer promessas ao St. António para que os veículos fossem apanhados!
Não é isto que se espera de um clube com a tradição e a estrutura do ACP!
O que se espera é que com o peso dos seus milhares de associados, que lhe dá alguma capacidade de representação dos automobilistas do país, inicie todas as movimentações necessárias a obter do Governo e das autoridades em geral, a correcção das injustiças e ilegalidades, criadas pela nova situação legislativa e que ponha o seu gabinete jurídico ao serviço da defesa dos sócios que pretendam defender-se dessas prepotências.

Blasfémias na TAP é que não!

As greves do pessoal de transporte aéreo, sejam da tripulação ou do pessoal de terra, são sempre das mais incómodas e que mais transtorno causam. Por isso, aqui deixo a minha simpatia para quem tem que viajar na TAP nos próximos dias.
Dito isto, greves como esta ocorrem em todos os países civilizados. Não é só em Portugal e na TAP. Ainda esta semana houve uma greve do pessoal aéreo em Itália (que afectou a viagem do Sporting a Roma, por exemplo). Para esta semana também está marcada uma greve da Air France. Só os liberais portistas, na sua dupla cegueira anti-TAP (e empresas públicas em geral) julgam que isto só ocorre com a principal transportadora portuguesa, onde se recusam a viajar. Nem que para isso tenham que perder muito mais tempo com escalas do que perderiam num vôo directo. Nem que tenham que ir a Londres para voar do Porto até Madrid...
O CAA deve conhecer muitos aeroportos de muitas cidades. Ele que vá mandando uns postais de todas as suas escalas...

Solecismo de Inverno

Uma correspondente devidamente identificada, que tem o hábito intempestivo de vingar o Vasco Barreto corrigindo todas as calinadas que aqui vou dando, informou-me que, no post anterior, dobrei a consoante errada na palavra fellatio. Ora, é preciso estar de grande má-fé para interpretar isso como um erro e não como um corajoso statement fonético-moral sobre a realidade. Parece-me que o espaço onomatopeico tem latitude suficiente para que fellatio e felattio possam ter existências paralelas. É claro que, na sua forma canónica, a palavrinha se grafa com dois ll e apenas um t. Mas não contem comigo para prolongar a hedionda conspiração de silêncio à volta desse nobre acto - alternativo, eslavo, sofisticadíssimo - que é o felattio. Há quem goste de fellatio; e há quem prefira o felattio ao fellatio. Respeitemo-nos mutuamente, por favor, ou acabamos todos como a Dra. Patrícia Lança.

Tuesday, October 23, 2007

Os grandes vencedores

Jean Todt soube sempre preservar os pilotos das influências externas. Recusou (e muito bem) terminantemente considerar a contratação de Fernando Alonso. Pelo contrário: disse que a Ferrari estava muito bem servida de pilotos e prolongou o contrato de Filipe Massa. E em corrida a Ferrari voltou a demonstrar uma excelente estratégia. Mas, mais do que isso, agiu como equipa. Jean Todt é um dos maiores vencedores deste campeonato, por demonstrar que não precisava de Michael Schumacher para ser campeão.
Kimi Raikkonen é outro grande vencedor. Finalmente conquistou um título e calou todos aqueles que chegaram a duvidar do seu valor – entre os quais, admito, me incluia. Preferia que fosse um piloto mais dedicado à afinação do carro, como é Alonso e eram Schumacher, Senna e Prost, mas não deixa de ser engraçado ver como campeão um piloto tão politicamente incorrecto, que diz sempre o que pensa e gosta de uma noite de farra e copos.
Falta Filipe Massa, mas os títulos não teriam sido possíveis sem ele. É o melhor segundo piloto que a Ferrari teve em mais de dez anos, e merece sem dúvida voar mais alto. Esperemos que sim.
Parabéns a todos. Para o ano isto vai ser giro...

Monday, October 22, 2007

O grande derrotado

Passou uma época a ver os seus dois pilotos digladiarem-se. Não foi isento nessa luta, apostando tudo num novato que, veio-se a ver, é um grande piloto mas ainda é inexperiente. Mas não prescindiu dos (bons) serviços do bicampeão do mundo em título, que afinava o carro e sabia (como o novato não sabe e nem saberá tão cedo) tirar partido dele. O bicampeão do mundo que tem um ego sem limites e, naturalmente, achava que era o maior e que não podia ter outro concorrente à altura dentro da equipa. Ambos os seus pilotos perderam o campeonato de condutores por um ponto, o que demonstra a total ausência de “jogo de equipa”. A McLaren este ano não foi uma equipa.
Perante isto, quase que nos esquecemos do aspec to mais negativo – e vergonhoso- desta temporada: o castigo à McLaren por espionagem. Só a equipa foi castigada – os pilotos puderam continuar a disputar o mundial pois supostamente “não eram culpados”. Pois nem depois de consumada a derrota este homem desiste, e quer à viva força conseguir para o seu “menino” na secretaria o que não conseguiu na pista. Nem que para isso a duplicidade de critérios tenha que ser total: os pilotos da McLaren são inocentes dos erros da equipa, mas os da Williams ou Sauber pelos vistos já não seriam...
Ron Dennis é um trapaceiro que não sabe perder.

"I was having a shit"

O novo campeão do mundo de Fórmula 1, no final da época passada.

Fátima ao serviço do anticomunismo militante

Foi transmitido no dia 12 de Outubro pela RTP1 um documentário denominado Fátima na Rússia, da autoria de uma jornalista da Rádio Renascença, Aura Miguel. Este documentário inseria-se nas comemorações dos 90 anos das denominadas aparições de Fátima. Só agora tive oportunidade de o ver. Mas a indignação que me provocou foi tão grande que não resisti a escrever sobre ele.

Fátima, para os oposicionistas a Salazar, fazia parte dos três F que caracterizavam a sua política cultural e ideológica, ou seja, fazia parte do conjunto de actividades privilegiadas pelo Regímen para anestesiarem a intervenção cívica das massas. Os outros dois eram o futebol e o fado. Hoje muita gente considera que os três F estão de volta, pois o futebol, mais do que no tempo do fascismo, invade diariamente o nosso quotidiano, dominando os media e as nossas conversas diárias. Quanto ao fado, a situação melhorou, tornou-se até o exemplo de canção portuguesa que resiste contra a maré da música anglo-saxónica, cantada muitas vezes por gente de esquerda e que actualmente passa por uma louvável renovação. Fátima, apesar das diferenças de época, continua, igualmente a merecer grande atenção quer dos media quer dos poderes públicos e, pela amostra do documentário referido, continua a desempenhar o papel que foi sempre o seu durante o fascismo, ou seja, o de estar ao serviço do anticomunismo militante.

Mas comecemos pelo mais espantoso. Já era do conhecimento de todos que o chamado segundo segredo de Fátima falava da conversão da Rússia e que se isso não sucedesse esta espalharia os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Ora como se sabe, e isso é dito expressamente no documentário, as chamadas aparições tiveram lugar entre Maio e Outubro de 1917, sendo a última a 13 daquele mês, com o referido milagre do Sol, e a Revolução Socialista de Outubro, contra quem aquele segredo é de facto dirigido, teve também lugar em 1917, simplesmente em 25 de Outubro, que, no calendário seguido no Ocidente, corresponde a 7 de Novembro. Apesar destas datas não baterem certas, para os católicos russos que são entrevistados no documentário isso não tem qualquer importância. O ano 1917 é que é verdadeiramente a chave dos acontecimentos. A nossa Senhora de Fátima já conhecia antecipadamente, e parece que os segredos foram todos revelados na aparição que teve lugar a 13 de Julho, os diversos passos que Lenine e os seus companheiros bolcheviques iriam dar para, segundo a expressão de um dos russos entrevistados, se atingir a fatídica noite de 25 de Outubro. Presciente conhecimento que, a 13 de Julho, antes dos próprios autores terem uma ideia clara como os acontecimentos se iriam desenrolar, já previa o que iria acontecer. É a história na sua visão mais mecanicista.

É evidente que se aquela coincidência de anos serve de explicação para russos beatos, qualquer historiador minimamente probo sabe que isso não é assim. Fátima inseriu-se inicialmente na luta do Portugal arcaico e camponês, dominado pela Igreja, contra o Portugal Republicano e de facto anti-clerical, que nesse mesmo ano tinha começado a enviar os seus filhos para a Guerra da Europa. Só muito mais tarde, e aqui as datas do documentário e alguma informação que recolhi na net não coincidem completamente, é que o segredo referente à Rússia foi revelado. Segundo o documentário ele teria sido escrito por volta de 1927, quando Lúcia, a única sobrevivente dos três jovens pastores da aparição, estava recolhida num convento em Tuy, Galiza. Foi depois revelado por Pio XII, em Outubro de 1942, ainda de acordo com o documentário, em plena batalha de Estalinegrado, mas de uma forma velada para não ofender as partes em confronto. Tudo isto mereceria um aprofundamento histórico, mas não me admiraria nada que, na mesma altura em que o mundo era de facto ameaçado pela besta nazi, que punha todo o seu empenho na derrota e destruição da União Soviética, se viesse clamar pela conversão da Rússia e mais, se pedisse a sua consagração ao Meu Imaculado Coração. Mas mesmo que presentemente se queira retirar este carácter agressivo e fascista ao segredo de Fátima, ele não poderá deixar de se inserir na Guerra Fria e servir às mil maravilhas para Salazar ter na mão um instrumento ideológico poderoso contra o comunismo e o Partido Comunista Português.

O cardeal Cerejeira, em 1953, numa daquelas manifestações guerreiras e belicistas que caracterizavam as cerimónias oficiais do salazarismo (vê-se no documentário o Exército a desfilar em Fátima), fala de Nossa Senhora de Fátima como a miraculosa anti-Rússia. É preciso ter descaramento para se vir reproduzir estas imagens que deviam envergonhar qualquer cristão, pois elas são um apoio explícito ao regímen que prendia, torturava e matava comunistas com a cumplicidade e conivência da Igreja oficial.

Mas o que é ainda mais espantoso são as bicadas que se dão ao 25 de Abril, mostrando imagens do Largo do Carmo, quando se diz que o Exército Azul levou novamente para os Estados Unidos o ícone de Kazan, uma relíquia da Igreja Ortodoxa russa, que ele tinha oferecido a Fátima, pois receava pela sua segurança. Só o tendo devolvido em 1982. O Exército Azul era uma organização reaccionária e anticomunista americana criada em 1947, nascida da Guerra Fria com a missão de converter a Rússia tal como era profetizado pelo segundo segredo e que tinha a sua sede em Fátima.

Nesta ausência de valores e de seriedade, há um católico russo que afirma, com grande candura, que leu clandestinamente na Rússia um livro onde se dizia que algures em Portugal há alguém que se interessava pela Rússia e a imagem a preto e branco, em tom contrastado forte, com música a condizer, mostra uma série de pobres peregrinos portugueses a dirigirem-se para Fátima, ficando nós com a sensação de que aquela gente iria rezar a Fátima pela conversão da Rússia. Esquece esse católico russo que em Portugal era, também, em nome de Fátima que se prendiam e torturavam comunistas.

É evidente que acompanhando estes panegíricos à contribuição de Fátima para a conversão da Rússia vem a descrição, com imagens, do que foi a política anti-clerical de Estaline, com a destruição de Igrejas, e as referências à morte de vários milhões de crentes. Mas, faz-se igualmente referências pouco abonatórias ao clero ortodoxo que colaborou com o regímen, ignorando que Estaline, para poder contar com o apoio da Igreja Ortodoxa na guerra contra os alemães, lhe concedeu certas liberdades, a que a Igreja correspondeu, contribuindo de facto para a derrota do invasor. É igualmente espantoso que faça referência à destruição de uma Igreja perto da Praça Vermelha e se diga de seguida que era para haver mais espaço para as paradas militares e a única que se mostre seja a da vitória da URSS contra os nazis, que é aquela que mais significado terá para os soviéticos. É evidente que a perseguição religiosa é desenquadrada de quaisquer perspectivas históricas, quase igualando a foi produzida nos tempos de Estaline com a que se verificou posteriormente. Esquecendo igualmente que a par de crentes, o maior massacre foi o de vários povos por razões que nada tinham ver com problemas religiosos e acima de tudo de comunistas, companheiros de Partido de Estaline, que esses provavelmente, para as almas caridosas que fazem o documentário, deveriam ser todos mortos.

O documentário termina com as afirmações de um dos entrevistados de que o caminho de Fátima não está terminado, que os que estavam antes ocupam presentemente postos de responsabilidade e que as pessoas continuam a viver sem Deus na Rússia e esperam mais de Fátima, mostrando a câmara símbolos comunistas que sobrevivem na Rússia de hoje. Está-se talvez preparar os telespectadores para a nova vaga de russofobia que a América está novamente a desencadear.

Li numa notícia que a televisão pública pretendia que este trabalho fosse um projecto inovador, tendo durante vários dias feito publicidade a este documentário, afirmando que havia imagens chocantes, penso que as únicas são as da destruição de igrejas, que há muito já foram exibidas em documentários sobre Estaline e a União Soviética. Como projecto inovador não tem nada, pondo mais uma vez Fátima ao serviço do anticomunismo militante.

A melhor da semana passada - 10



A justiça criminosa

Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado. Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada.

Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia que se sabe que nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado. Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao caso Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve. Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas, pedaços do enigma, peças do quebra-cabeças. E habituámo-nos a prescindir de apurar a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história é uma coisa normal em Portugal e que este é um país onde as coisas importantes são «abafadas», como se vivêssemos ainda em ditadura. E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas. Apesar dos jornais e das televisões, dos blogues, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade. Do caso Portucale à Operação Furacão, da compra dos submarinos às escutas ao primeiro-ministro, do caso da Universidade Independente ao caso da Universidade Moderna, do Futebol Clube do Porto ao Sport Lisboa e Benfica, da corrupção dos árbitros à corrupção dos autarcas, de Fátima Felgueiras a Isaltino Morais, da Bragaparques ao grande empresário Bibi, das queixas tardias de Catalina Pestana às de João Cravinho, há por aí alguém que acredite que algum destes secretos arquivos e seus possíveis e alegados, muito alegados crimes, acabem por ser investigados, julgados e devidamente punidos? Vale e Azevedo pagou por todos. Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo «normal» e encolhem os ombros. Quem se lembra dos doentes infectados por acidente e negligência com o vírus da sida? Quem se lembra do miúdo electrocutado no semáforo e do outro afogado num parque aquático? Quem se lembra das crianças assassinadas na Madeira e do mistério dos crimes imputados ao padre Frederico? Quem se lembra que um dos raros condenados em Portugal, o mesmo padre Frederico, acabou a passear no Calçadão de Copacabana? Quem se lembra do autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal?

Em todos estes casos, e muitos outros, menos falados e tão sombrios e enrodilhados como estes, a verdade a que tivemos direito foi nenhuma. No caso McCann, cujos desenvolvimentos vão do escabroso ao incrível, alguém acredita que se venha a descobrir o corpo da criança ou a condenar alguém? As últimas notícias dizem que Gerry McCann não seria pai biológico da criança, contribuindo para a confusão desta investigação em que a Polícia espalha rumores e indícios que não substancia. E a miúda desaparecida em Figueira? O que lhe aconteceu? E todas as crianças desaparecida antes delas, quem as procurou? E o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos, alguns menores, onde tanta gente «importante» estava envolvida, o que aconteceu? Arranjou-se um bode expiatório, foi o que aconteceu. E as famosas fotografias de Teresa Costa Macedo? Aquelas em que ela reconheceu imensa gente «importante», jogadores de futebol, milionários, políticos, onde estão? Foram destruídas? Quem as destruiu e porquê? E os crimes de evasão fiscal de Artur Albarran mais os negócios escuros do grupo Carlyle do senhor Carlucci em Portugal, onde é que isso pára? O mesmo grupo Carlyle onde labora o ex-ministro Martins da Cruz, apeado por causa de um pequeno crime sem importância, o da cunha para a sua filha. E aquele médico do Hospital de Santa Maria suspeito de ter assassinado doentes por negligência? Exerce medicina? E os que sobram e todos os dias vão praticando os seus crimes de colarinho branco sabendo que a justiça portuguesa não é apenas cega, é surda, muda, coxa e marreca.

Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos estes casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento. Ninguém quer saber a verdade. Ou, pelo menos, tentar saber a verdade. Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os «senhores importantes» que abusaram, abusavam, abusam e abusarão de crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra. Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças, de protecções e lavagens, de corporações e famílias, de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade. Este é o maior fracasso da democracia portuguesa e contra isto o PS e o PSD que fizeram? Assinaram um iníquo pacto de justiça.

Clara Ferreira Alves, Expresso, 20 de Outubro 2007

Sunday, October 21, 2007

Foi lindo!

A informação como ficção e a ficção como informação


Tenho que agradecer ao Expresso pois, através de um dos seus brindes, permitiu-me descobrir este filme de Barry Levinson, "Manobras na Casa Branca" ("Wag the Dog"), de 1997.
Um "consultor" da Casa Branca (Robert de Niro) e um produtor de Hollywood (Dustin Hoffman) declaram guerra à Albânia, possuidora da perigosa "bomba atómica numa mala", e depois fazem a paz e trazem de volta um herói americano pouco recomendável.
Tudo isto, que só acontece na televisão, tem como objectivo distrair o povo dos pecadilhos sexuais de um presidente que pretende ser reeleito alguns dias depois. Uma óbvia alusão ao saudoso presidente Clinton.
Um DVD que me provocou algumas gargalhadas e que constitui um exercíco inteligente sobre a televisão como atestado de veracidade. Devia ser mostrado nas escolas para ensinar a ver os noticiários televisivos.

Quem eu quero que seja campeão do mundo?

Qualquer um menos o Alonso. Amanhã eu explico melhor depois de se saber o resultado.

Como estará Paris?



Faz hoje um ano que apanhei o avião no aeroporto Charles de Gaulle e, desde então, não mais lá regressei. As obras do trólei do Boulevard Jourdan, que a fotografia documenta e que me acompanharam por toda a minha estadia e mais algum tempo, já acabaram com certeza. Esta é a última foto por mim conhecida, com a minha antiga casa à direita. Como estará tudo agora? A Casa de Portugal da Cité Universitaire já reabriu, só uns meses depois do previsto. Foi inaugurado o museu da imigração. O Sarkozy é presidente.
Ninguém deveria passar mais do que um ano sem ir a Paris. Ai que saudades!

Saturday, October 20, 2007

We hate it when our pets become unanimous

Depois do besuntado consenso que acolheu Philip Roth nas últimas semanas (até o barbeiro de Paio Pires se mostrou resignadamente cínico com o enésimo golpe de rins da Fundação Nobel) convém lembrar um detalhe menor: o homem não publica um bom livro desde 1998. The Dying Animal era aceitável, mas Roth-light; The Plot Against America era Roth-bored e, a espaços, Roth-boring; e Everyman era praticamente Roth-comatose. Pode parecer mesquinho apontar isto, não apenas porque o seu currículo prévio inclui pelo menos meia-dúzia de obras-primas, mas também porque Roth a meio-gás continua a ser melhor do que para aí 90% da hiper-actividade afectada pelo resto do pelotão. Não tenho nada contra a histeria: só contra a histeria uniforme.
Exit Ghost, que me chegou às mãos ontem à tarde (e aqui uma menção honrosa para a Amazon, que conseguiu decifrar o meu código postal antes da EDP, da PT Comunicações e dos taxistas do Seixal) apresenta todos os sinais de um regresso à boa forma, recuperando os três alicerces estruturais das melhores ficções de Roth: o rancor misógino, a estridência narrativa, e Zuckerman.
O melhor augúrio de todos foi a opinião negativa de Christopher "Soprano" Hitchens, cada vez mais inseguro sobre a sua própria classificação taxonómica (primata, sim, mas qual a sub-ordem?). Com o seu assombroso anti-talento para a imprecisão crítica, desperdiçou meia-dúzia de boas piadas a martelar o livro nas páginas da Atlantic. (O texto está disponível aqui e merece ser lido, de preferência em voz alta, com sotaque de Brooklyn e um revólver na peúga).
Para percepções astutas, como de costume, temos de consultar James Wood, que não tem tempo para se sentir ofendido com felattios compulsivos, e encapsula a essência de Roth (defeitos e virtudes) em duas passagens antológicas:

«The danger in Roth’s work has always been a slightly sentimental didacticism; an example is the coercive way he has leaned on the word “human” in the past few years—one of those words which always answer their own questions. In Roth’s world, to be human is to have the “human stain,” is to get things wrong, to get people wrong, to make mistakes, to have a sexual body, to be messy and vital and, above all, male. Roth has sometimes resembled a man standing on a corner wearing a huge sandwich board bearing the words, in irritatingly hectoring capitals, “WE ARE ONLY HUMAN”; “Everyman,” a book both deeply moving and somewhat self-pitying, seemed to switch the board for one with the message “WE ARE DYING.” His new novel is a better novel than “Everyman,” intricate, artful, and pressing, and avoids sentimentality with the comedy that the latter novel lacked.
(...)
Roth has been the great stealth postmodernist of American letters, able to have his cake and eat it without any evidence of crumbs. This is because he does not regard himself as a postmodernist. He is intensely interested in fabrication, in the performance of the self, in the reality that we make up in order to live; but his fiction examines this “without sacrificing the factuality of time and place to surreal fakery or magic-realist gimmickry,” as Zuckerman approvingly says of Lonoff’s work. Roth does not want to use his games to remind us, tediously and self-consciously, that Nathan and Amy and Lonoff are just “invented characters.” Quite the opposite. Unstartled by their inventedness, he swims through depthless skepticism toward a series of questions that are gravely metaphysical, and more Jamesian than Pynchonian: How much of any self is pure invention? Isn’t such invention as real to us as reality? But then how much reality can we bear? Roth knows that this kind of inquiry, far from robbing his fiction of reality, provokes an intense desire in his readers to invest his invented characters with solid reality, just as Nathan once invested the opaque Amy Bellette with the reality of Anne Frank. In this kind of work, the reader and the writer do something similar—they are both creating real fictions.
Fiction, for Roth, is not what Plato thought mimesis was: an imitation of an imitation. Fiction is a rival life, a “counterlife,” to use the title of one of Roth’s greatest novels, and this is why his work has managed so brilliantly the paradox of being at once playfully artful and seriously real

A última afronta que um autor destes merece é unanimidade; gostava de ler mais reacções como as de Hitchens. E o Nobel, merece? Sinceramente, desde Dario Fo, deixei de fazer perguntas dessas em voz alta. Acho muito mais provável que lhe entreguem o da Paz, pelo projecto do Diasporismo desenvolvido em Operation Shylock.

Pensamento do dia

Eu acho que há algo de profundamente errado com tudo isto.

A história da PIDE




Friday, October 19, 2007

Quem será a Abelha Maia?


Há três clubes chamados grandes no futebol português: a Cigarra, a Formiga e o Kalimero.
A Cigarra é o Benfica: faz-se tratar por «A Instituição» e auto-intitula-se de «maior clube do mundo». (...)
A Formiga é o FC Porto: (...) Ela sabe que, para ganhar mais vezes do que os outros é preciso muito trabalho, muito talento, muita organização, muita humildade e uma cultura de vitória que não se consegue com simples proclamações de superioridade natural.
O Kalimero é Sporting e é o caso mais problemático. (...) O Sporting não sabe perder e, por isso, adoptou a atitude do Kalimero, sempre a queixar-se dos «meninos maus» que lhe roubam a bola no recreio. É já uma cultura entranhada entre os sportinguistas, tão entranhada como o é a cultura de vitória entre os portistas ou a cultura de superioridade entre os benfiquistas.
(Miguel Sousa Tavares, A Bola, 02-10-2007)

Por mim não me importo. Sempre adorei o Calimero (com C). Agora nesta história quem é a Abelha Maia?

O testador que não resolve problemas

Um instrumento muito útil para quem usa frequentemente pilhas (mesmo recarregáveis, como eu) seria um testador digital de pilhas, como o que é proposto esta semana por uma conhecida cadeia de lojas de desconto. Só que o testador que eles propõem funciona... a pilhas. Ora pipocas.

Thursday, October 18, 2007

Agostinho Neto – A Queda de um Anjo

Li de uma assentada um documento impressionante sobre o que foi o 27 de Maio de 1977, em Angola. O livro, da autoria de Dalila Cabrita Mateus e de Álvaro Mateus, chama-se Purga em Angola – Nito Alves, Sita Valles, Zé Van Dunen o 27 de Maio de 1977 e foi lançado recentemente pela Edições Asa.
Descreve o que foi a tentativa, pouco clara, de um golpe de estado contra o poder de Agostinho Neto e de alguns dos seus apaniguados na Direcção do MPLA, encabeçada pelos nomes referidos no título do livro. Os autores põem mesmo em causa que tenha havido qualquer tentativa golpista e consideram que aqueles foram vítimas de uma provocação organizada pelo grupo dirigente vitorioso.
Mas o que é mais impressionante é o saldo de morto provocado pela repressão desencadeada pela fracção vencedora, que, numa estimativa prudente, chega atingir 30.000 mortos, todos eles executados sem nenhum julgamento e depois da grande maioria ter sido torturada e mantida na prisão em condições deploráveis. Foi verdadeiramente uma purga que se abateu sobre companheiros de armas e de partido e que consistiu numa violação extremamente grave dos mais elementares direitos humanos.
Agostinho Neto aparece à luz destes relatos como uma personagem centralizadora, ávida de poder e de tudo controlar, pouco recomendável como chefe de Estado consensual e defensor do seu povo. É, pode-se afirmar, a desmontagem de um mito para aqueles, como eu, que nunca se debruçaram com grande rigor sobre a história recente de Angola, e consideravam a personagem como um herói da independência, apesar daqui e dali virem alguns avisos sobre o seu comportamento pouco recomendável.
O que é mais interessante é que o livro é escrito de uma perspectiva de esquerda, fazendo uma apreciação favorável dos derrotados e assassinados do 27 de Maio, apontados com gente próxima dos comunistas, em alguns casos como Sita Valles, como ex-militante da UEC e por esse motivo expulsa do MPLA, ou como simpatizantes da União Soviética, como o próprio Nito Alves. Chega-se a insinuar que, para além da afirmação de poder por parte de Agostinho Neto e da sua clique, este massacre visava abrir as portas ao reconhecimento ocidental, principalmente dos americanos. Verifica-se uma certa cumplicidade das tropas cubanas no esmagamento inicial do golpe, mas não participando nos massacres posteriores, e uma neutralidade da União Soviética que parece não interferir nos acontecimentos. O PCP, que foi acusado, há boca pequena, pela fracção vitoriosa, de estar por trás dos acontecimentos e pretender controlar a situação em Angola, segundo os autores, nada teve a ver com o assunto e no rescaldo dos acontecimentos, na sua táctica tradicional de não fazer ondas no campo socialista, aceitou passivamente que alguns dos seus militantes, que foram acusados em Angola de pertencer à fracção nitista, fossem suspensos das suas células para não agastar a direcção vitoriosa do MPLA.
Em Portugal não se deu grande importância aos acontecimentos, tendo o Presidente da República, Ramalho Enes, o PS, a imprensa da época e nossa intelectualidade, excepto Natália Correia, aceitado passivamente o que se passava em Angola.
Lembro-me que há época, um jornal esquerdista, ter lançado a atoarda de que o golpe tinha sido apoiado pela União Soviética com a cumplicidade do PCP e, segundo me lembro, nem uma palavra diziam sobre a repressão que se lhe seguiu. Este assunto, visto não ser citado no livro, mereceria agora ser recordado.
Estamos pois perante um documento impressionante, parecendo-me com grande rigor histórico e documental, que merece ser lido por todos aqueles que sobro passado não querem pôr uma pedra.

Cimeiras Bizantinas



Parece que vamos ter um tratado sobre o sexo dos anjos.
Os dirigentes máximos dos países da UE encontram-se em Lisboa para mais umas guerrinhas de cacarácá. Vem o arrogante Gordon Brown, o ridículo Prodi que já não manda em nada e, talvez, os sempre irrequietos e boçais irmãos polacos. Vêm todos e vão puxar cada um para seu lado mesmo com risco de o pano se romper.

Entretanto a Europa afunda-se em decadência. O seu orgulhoso Estado Social está a caminho da insolvência. As suas empresas correm o risco de ser compradas ou perder os mercados para concorrentes que fazem metade do preço. O seu estatuto económico, criado e mantido à custa dos recursos do planeta, parece tremer perante as ameaças formidáveis da Rússia da Índia e da China.

Nos meus pesadelos vejo chegar um tempo de desespero e de guerra. A história mostra que a guerra surge quase sempre quando novos poderes ameaçam as potências instaladas.
"A guerra que virá não é a primeira" mas, pela sua incomensuravel brutalidade, só parece possível no quadro de um qualquer novo tipo de nazismo.

Entretanto os nossos dirigentes entretêm-se com bizantinices...

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A bem da cultura geral:
Discutir o sexo dos anjos - a origem desta expressão situa-se no ano de 1453 durante a tomada de Constantinopla pelos turcos. O último soberano do império Romano do Oriente, Constantino XI, comandava a resistência aos maometanos enquanto as autoridades cristãs mantinham acaloradas discussões teológicas num concílio, uma das quais era se os anjos tinham ou não sexo. Não puderam chegar a nenhuma conclusão. O imperador foi morto juntamente com milhares de cristãos e os novos conquistadores ali se estabeleceram sob as ordens de Maomé I.

Terá Jardim influenciado o resultado do PSD?


Esta fotografia, que encontrei no blogue do João Paulo Pedrosa, recorda-me um bom motivo para a saída de Marques Mendes da liderança do PSD: a sua vergonhosa subserviência a Alberto João Jardim, para garantir os votos dos militantes da Madeira nas eleições directas. Alguém se lembra das palavras de Jardim? Segundo o Público, Marques Mendes perdeu-se na multidão do Chão da Lagoa. Jardim perguntou: “Onde é que se meteu esse sacana? É tão pequenino que ninguém o vê.” (É uma pena que não haja gravações.) Se este facto influenciou os militantes do PSD, por terem vergonha de um líder que se presta a uma cena dessas, eu fico algo aliviado. Mas não muito: não creio que com a mudança de líder a relação de Alberto João Jardim com o “continente” (a começar pelo seu próprio partido) se altere.

"Pato Bravo" à Lisboa




"O Guggenheim foi a prova de que era possível gerar turismo com base na arquitectura. A nova Bilbau descobriu aí a sua vocação. Porque não disponilizar-se como laboratório da melhor - e, sobretudo, mais prestigiada - arquitectura? "Enquanto experiência urbana, não vi isto em mais lado nenhum", diz Carlos Irijalba. Bilbau assume: quer ser "a cidade dos Prémios Pritzker". E está a contá-los, cinco no total: Frank Gehry, Norman Foster, Santiago Calatrava, Zaha Hadid e o português Álvaro Siza, que tem um projecto para o futuro salão nobre da Universidade do País Basco."

Público, 14 de Outubro 2007

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Em Lisboa, pelo contrário, os grandes arquitectos são proscritos; qual Siza ?.. qual Ghery ?...Já que não temos o "Pato à Pequim" especializamo-nos no "Pato Bravo à Lisboa".

Wednesday, October 17, 2007

Arma de arremesso de Bush ?


Ao ver o Dalai Lama a ser recebido, elogiado e condecorado por George W. Bush não posso deixar de considerar pertinentes os comentários que fiz aqui e também aqui.
Pelo menos para mim tudo se tornou agora mais claro.

É necessário mudar algo para que tudo fique na mesma

A Coluna Infame, o primeiro blogue que eu li (e, talvez, o melhor blogue português de sempre) voltou. Somente com os seus dois elementos produtivos, e que deram a merecida reputação ao blogue. Desta vez, a Coluna Infame chama-se Gattopardo.

Adriano e a sua voz nos blogues


Adriano Correia de Oliveira, nascido no Porto a 9 de Abril de 1942, deixou-nos muito cedo, aos 40 anos.

A sua vida foi breve, mas, não foi em vão.

Entre 1960 e 1980, gravou mais de 90 temas, sendo a sua música sempre repleta de muita emotividade, evidenciando dedicação aos trabalhadores, ao povo, aos ideais da liberdade, da democracia e do socialismo.

Morreu em Avintes, localidade que o viu crescer, a 16 de Outubro de 1982.

No dia 16, vamos congregar esforços, para ouvirmos a sua voz nos blogs.


Uma excelente iniciativa do Vozes Silenciadas.

Tuesday, October 16, 2007

Dar a mão à palmatória ou o braço a torcer


Reconheço que me precipitei na apreciação que fiz do Luís Filipe Menezes. É evidente, tal como sublinhei nos meus posts, que o PSD já tinha ensaiado no tempo do respeitável Cavaco Silva um ataque pela esquerda ao PS e que lhe tinha, na altura, rendido dividendos eleitorais. Pensava eu, por algumas afirmações do dito senhor, que essa táctica iria agora ser novamente ensaiada. Por outro lado, algumas avis raras do comentário nacional tinham partido em cruzada contra o populismo e o pertenço esquerdismo do novo presidente do PSD o que me indignou e me fez sair em sua defesa.
Quando, depois do Congresso, o senhor começou a falar viu-se o caminho que iria traçar e esse é já bem perigoso, porque junta a fome (da direita) com a vontade de comer (do PS-Sócrates). Ou seja, apesar de continuar a falar da insensibilidade social do PS, o que propõe é uma nova Constituição, o projecto reaccionário que a direita sempre acalentou. Penso que não vai contar com a aquiescência do PS, seria muito escandaloso, mas uma revisãozinha que facilite os despedimentos contará com certeza com a sua colaboração e por aí fora até que a Constituição seja completamente desvirtuada.
As privatizações propostas e o reforça da componente neoliberal será também do agrado do PS-Sócrates. Portanto, temo bem que estejamos numa nova arrancada direitista, em que o PS, para não deixar nas mãos do PSD todas as propostas de direita, irá ceder, como é seu costume, naquilo que verdadeiramente interessa ao patronato.

Os nossos rapazes em Alma-Ata

Hoje os nossos rapazes enfrentam os cazaques na sua saga por uma presença, honrosa, no próximo europeu de futebol. Não costumo perorar sobre o desporto rei mas, desta vez, abro uma excepção dado o local do jogo.


É que Alma-Ata, ou como se diz agora Almati (significa "pai das maçãs"), foi uma cidade que visitei da primeira vez que pisei solo soviético nos idos de 1980. As maçãs eram realmente gigantescas, chegavam a pesar 800 gr.


Recordo claramente as enormes pilhas de melões e de muitas outras frutas que nos são familiares. Era Setembro e Alma-Ata era uma enorme aldeola com camponesas de lenço pela cabeça, como as nossas, mas de olhos em bico.









Também recordo o estádio olímpico, das olimpíadas de inverno. Os portugas como eu acabaram as suas aventuras de patinagem sobre lâminas saindo, de gatas, para fora da enorme pista onde deslizavam centenas de domingueiros (também de olhos em bico).




Agora, consta-me, já não são soviéticos e têm milhões de barris de petróleo para vender.Deve estar tudo muito diferente.







Isso não os vai salvar de uma ensinadela frente aos nossos rapazes, que são o único petróleo que nos resta. Tenho a certeza de que vão ficar com os olhos em bico.

Aquecimento global e Nobel da Paz

Alguns esclarecimentos sobre os comentários que os meus textos sobre o Nobel da Paz de 2007 suscitaram.
O Prémio Nobel da Paz é um prémio político. Não é um prémio científico. De nenhum modo a atribuição deste prémio significa um reconhecimento da realidade do aquecimento global. É antes um reconhecimento do seu trabalho em prol de uma causa meritória para a humanidade. É um prémio que pressupõe um julgamento moral.
Nesse aspecto dou razão ao Luís Aguiar Conraria no seu comentário: um prémio como o Nobel da Paz não deve ser atribuído para um trabalho que deve ser científico. A ciência não tem moral e nem responsabilidade social; o seu objectivo é, pura e simplesmente, a procura da verdade, por mais inconveniente que esta seja. Por isso o prémio teria sido melhor atribuído a Al Gore (cuja dedicação à causa do ambiente é muito antiga) e a grupos ecologistas.
A hipótese do aquecimento global causada pelo homem é o melhor que nós conhecemos. É presentemente a nossa realidade. É suportada por 90 por cento dos especialistas em climatologia, baseada no trabalho de perto de uma década de mais de 1000 investigadores provenientes de 130 países diferentes. O que não quer dizer que seja a última palavra a dizer sobre o assunto. Agora quem (legitimamente) não está satisfeito com a melhor explicação conhecida para o aquecimento global, que trate de propor outra e mostrar, com base em experiências credíveis, que a actual explicação está errada ou, pelo menos, que existe uma melhor explicação. É assim que funciona a ciência. Eu nunca vi isso em lado nenhum. Pelo contrário, só vi pessoas (por vezes cientistas) a contestarem a actual explicação por esta lhes ser... inconveniente. Por esta requerer uma alteração dos seus hábitos de vida, que há muito se sabe serem poluentes. Por estarem mais preocupados em continuarem a trnasportar-se de carro todos os dias, para não terem de se misturar com o “povo” em transportes públicos. Por não se quererem dar ao trabalho de reciclar. E de usar mais vidro e menos plástico. O que eu não posso aceitar é que esses cientistas disfarcem o seu comodismo e o seu egoísmo como "ciência".
Tudo isto implica um certo esforço, mas não é assim tanto. Na Holanda, toda a gente se transporta de bicicleta ou transportes públicos. Tal como se comia e bebia em louça, pode voltar-se à louça e abandonar os pratos, copos e talheres de plástico. Tudo é uma questão de mentalidade.
Finalmente, quero recordar algo ao Ricardo S. Carvalho (francamente, não sei mesmo se ele sabe). O Prémio Nobel da Paz pressupõe um julgamento moral, como referi. Ser-se “de esquerda” também. São duas coisas diferentes: o Prémio Nobel da Paz não é necessariamente de esquerda (das últimas vezes tem sido, mas nos anos 70 até ganhou o Kissinger). Pode acontecer estarem ambas erradas: prémios Nobel mal atribuídos, que não façam sentido, e opções políticas de esquerda (acontece às vezes). A verdade científica deve prevalecer, mas enquanto ela não existe (e isto admitindo que ela ainda não existe para o aquecimento global, o que está longe de ser pacífico), a esquerda tem o direito de ter as suas opções. Neste contexto, só uma opção de preservar o meio ambiente e melhorar a vida para todos no nosso planeta (contrária aos grandes interesses económicos) se pode considerar de esquerda. Isto é: só uma opção ecológica. Anteriormente falava do Prémio Nobel da Paz; agora falo de esquerda. Não estou a falar de ciência. Para isso (no que diz respeito ao aquecimento global), não sou o mais qualificado.

Sobre este assunto ler ainda o Klepsýdra, o De Rerum Natura, o Vida Breve, o Verdade ou Consequência e o Cosmic Variance.

Monday, October 15, 2007

Menezes e os Gatos


Menezes fez, no XXX Congresso do PSD, se não um grande discurso pelo menos um discurso grande. Para além de outras miudezas já se percebeu ao que vem: convencer o bom povo português de que sabe, e quer, e pode e manda baixar a despesa pública para poder poupar o bom povo português às consabidas dores de parto do progresso. Exactamente o que o engenheiro Sócrates não sabe, e não quer, e não pode e não manda fazer.
Por mero acaso o Sr. Menezes omite que ao baixar a despesa acabará inevitavelmente por atingir aqueles que finge querer poupar. Um mero detalhe...

O que ele, Menezes, também não sabia era que horas depois os Gatos Fedorentos iriam, involuntáriamente, dar-lhe uma ajuda massacrando o seu adversário de forma mil vezes mais eficaz. Há horas de sorte. Se não viu veja aqui:




Paulo Autran (1922-2007)


Morreu talvez o maior actor do Brasil. Nunca me hei-de esquecer: uma vez, na década de 90, Autran trouxe a Portugal o seu espectáculo teatral. As críticas nos jornais foram todas bastante favoráveis, mas uma - do Público - incluia uma "sugestão" supostamente cúmplice ao mui erudito leitor, ao recomendar a peça: "esqueçam que é brasileiro"! Esqueçam que é um actor das telenovelas! Compreensivelmente, Autran declarou sentir-se discriminado em Portugal.
Já não me recordo do "crítico" que proferiu tal "recomendação". Nem interessa; ninguém se vai recordar do crítico, mas quem viu o Paulo Autran a actuar jamais o esquecerá. Masmo que tenha sido só em telenovelas, como eu.

Morreu o Bimbo


Mais aqui e aqui.

Sunday, October 14, 2007

A melhor da semana passada - 9

Peregrinos perderam a paciência com a espera para entrar na nova igreja.
A vaia foi monumental à porta da nova Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima. Os peregrinos perderam a paciência com as autoridades eclesiásticas, que mantinham as portas do templo fechadas, ontem, já passava das 13.30, quase 24 horas passadas após a inauguração.

Gritos, assobios e gente a reivindicar que "isto foi construído com o nosso dinheiro", ensombraram o brilho da cerimónia oficial da véspera. Porque a nova "Basílica", como lhe chamou o cardeal Bertone em conferência de imprensa ontem à tarde, foi um dos motivos que levou muitos fiéis a ir ao Santuário nesta peregrinação.

Ainda não eram 09.00, Alfredo Ribeiro, 40 anos, já tinha contornado a Igreja da Santíssima Trindade (IST). A viagem de Marco de Canavezes a Fátima havia sido longa e queria ver o monumento antes das celebrações habituais, no Santuário, às 10.00. Não conseguiu. "Já sei que não a vou ver, porque à tarde poucos vão conseguir entrar e nós voltamos hoje para casa".

A hora prevista para a abertura das portas apontava, de manhã, para as 13.00. Três guardas impediam a aproximação do pórtico principal, uma entrada esplendorosa, em bronze, com 64 metros quadrados. Alguns peregrinos lá conseguiam tocar-lhe e tirar a fotografia desejada.

Diário de Notícias, 14.10.2007

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Foi uma espécie de "inti-fátima"...
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O inconsciente, esse grande name-dropper

Num eventual catálogo Borgesiano de sonhos pretensiosos, não sei que posição este ocuparia, mas na noite passada sonhei que estava na Praia das Maçãs, a jogar matraquilhos com Edmund Wilson e Mary McCarthy. Eu jogava com o Sporting e eles com o Benfica. Levei uma abada. Às tantas, para disfarçar, comecei a dar uma palestra sobre a história das respectivas instituições e disse que o Sporting tinha sido fundado em 1905. Edmund Wilson corrigiu-me imediatamente, mas o ar desapontado com que o fez estragou-me o Domingo inteiro. Ser corrigido pelo meu próprio inconsciente: não era isto que eu queria da minha vida adulta.

Saturday, October 13, 2007

Pseudo-cientistas ao serviço do lóbi das petrolíferas

Não é nada surpreendente como no Insurgente reagem ao Nobel de Al Gore. Mas sobre esta questão, dois pontos. Desde quando é que um prémio Nobel da paz é um prémio científico? Quanto à ciência propriamente dita, não é demais recordar que 90% (noventa por cento) da comunidade científica está de acordo em que o aquecimento global existe e deve-se principalmente à acção do Homem. O AAA poderia apresentar-nos argumentos dos 10% de cientistas que não concordam. Mas da próxima vez por favor não remeta para argumentos de quem de cientista não tem nada.
Sobre esta questão: realmente Al Gore não é cientista. Mas o prémio foi partilhado com o IPCC, que merece todo o crédito. Leiam ainda o Klepsýdra.

Friday, October 12, 2007

Um convite desdobrável lançado dos aviões



Para aceder à Felicidade em 1968 bastava apresentar este convite:

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