No último filme de Milos Forman, já tratado neste blog, há uma linha que me parece muito interessante.
Começa a esboçar-se logo no principio, quando os padres da inquisição se interrogam perante as gravuras de Goya: “É então assim que somos vistos em todo o mundo?” , e quando Lorenzo Casamares, para proteger o pintor ou melhor, o seu retrato que ele estava a produzir, desencadeia o processo que está na origem da trama emocional do filme.
Goya não é ali simplesmente Francisco de Goya y Lucientes, pintor.
É aquele que detém o temível poder de revelar a natureza profunda do mundo e da alma dos homens. Melhor dizendo, de propôr uma "interpretação" dessa natureza.
Veja-se o temor quase reverencial com que o inquisidor e a rainha se aproximam pela primeira vez dos seus retratos; eles vão descobrir como é que são na realidade, ou seja, para os outros. E agradados ou não, não se atrevem a contestar a sua imagem.
Talvez por isto, Milos Forman não chamou a este seu filme “Goya”, como chamou “Amadeus” ao outro, que alguns críticos insistem em colocar em comparação para se declararem desiludidos com a falta de peso e consistência do personagem...
Para mim este filme não é obviamente sobre Goya. O pintor é um instrumento, um símbolo do poder da imagem, que consiste em nos apresentar a realidade em conjunto com uma proposta de interpretação. Ou seja, a realidade como objecto questionável.
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