Em 1947, a ONU aprova um plano de partilha da Palestina em dois estados: um judaico, com um milhão de habitantes, 510 mil dos quais árabes; um árabe, com 814 mil habitantes, 10 mil dos quais judeus.
Jerusalém, cidade santa para três religiões, ficaria com estatuto de cidade internacional. Segundo as estimativas da época, a população árabe da Palestina era de um milhão e 300 mil pessoas e a judaica rondava o meio milhão.
A 15 de Maio de 1948, David Ben Gurion proclama o nascimento do Estado de Israel. Com uma fronteira radicalmente diferente da aprovada pela ONU. Com um território um terço superior ao acordado. A "Grande Israel" estava em marcha. O Estado Palestiniano era um nado-morto. Até hoje!
No seguimento destes acontecimentos, a ONU aprova, em 1949, a Resolução 194, que decide permitir aos refugiados que o desejem o regresso às suas casas com direito a compensações pela destruição dos seus bens. Só que em 1948, David Ben Gurion, então primeiro-ministro, declarou: "Devemos impedir o seu regresso a qualquer preço". Hoje são mais de três milhões.
Na sequência da Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel ocupa o resto da Palestina (Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém-Leste). Ao arrepio da Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU, nesse mesmo Verão a colonização dos territórios ocupados começa com a construção de novos colonatos. Lucidamente, David Ben Gurion defende a não colonização, prevendo as consequências da transformação do seu país em potência ocupante. Hoje existem mais de 200 mil colonos instalados em colonatos nos territórios ocupados.
Esta é a raiz real e profunda do conflito. Só com a retirada do exército israelita para as posições anteriores às ocupações de 1967 e a destruição do muro; só com o desmantelamento de todo o sistema de colonatos israelitas; só com o fim do cerco a Gaza; só com a solução da questão dos refugiados palestinianos de acordo com as resoluções da ONU, só com o reconhecimento do direito do povo palestiniano à edificação do seu Estado, livre, independente e viável com capital em Jerusalém Leste, lado a lado com Israel; só verificadas todas estas condições é que poderemos falar de uma real paz justa e duradoura na região.
Em Israel e no campo palestiniano todos os intervenientes políticos o sabem. Dos dois lados há quem lute consequentemente por esta solução. Dos dois lados há quem a procure destruir e inviabilizar.
A chamada comunidade internacional omite que, quer na sociedade israelita, quer na sociedade palestiniana, há forças sociais e políticas bem diferenciadas. Esconde que há radicais dos dois lados da barricada. E moderados. E forças consequentes. Fala do terrorismo palestiniano, que é real. Mas aceita de bom grado chefes de Governo terroristas (Begin, Shamir, Sharon) que afirmam alto e bom som que primeiro há que matá-los (os palestinianos) para só depois negociar. Que proclamam que a Palestina é a Jordânia. Aceita governos de Israel onde participam partidos, com vários ministérios, que, em palavras e actos, negam TODOS os direitos aos palestinianos.
Há quem seja incapaz de ver os acontecimentos de forma diferente da redutora divisão entre bons de um lado e maus de outro. Felizmente há outros exemplos. Como o professor Richard Falk, relator especial do Conselho dos Direitos Humanos da ONU. Como Daniel Barenboim e Mariam Said, os promotores da paz através da música. Como o PC de Israel e a Frente Democrática para a Paz e a Igualdade que nestes dias se reuniram em Ramalah com representantes de facções da esquerda palestiniana, incluindo a Frente Democrática para Libertação da Palestina, a Frente Popular para a Libertação da Palestina e o Partido do Povo Palestino (comunistas). Como os militares que se recusam a disparar e a bombardear a Palestina. Como tantos e tantos outros que em Israel e na Palestina defendem um processo de paz genuíno. O trágico, dizem, é que isto é possível. Só é preciso querer.
Monday, January 12, 2009
Não há «israelitas» nem «palestinianos»
Artigo de António Vilarigues no Público de 9 de Janeiro. Tomo a liberdade de o reproduzir aqui, pois considero que sumariza muito bem tudo o que está em questão no conflito israelo-palestiniano.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
Blog Archive
-
▼
2009
(761)
-
▼
January
(89)
- Olho por olho...
- A falta que os pobres fazem
- Sócrates como subsídio
- Grande vitória da imprensa nacional
- UM POVO FELIZ: AQUI!
- Pode-se viajar no tempo?
- Síndrome "avião de Sá Carneiro"
- O Estado da nação
- Os despedimentos são notícia ?
- Ainda sobre o referendo em Viana
- Proposta após o referendo de Viana
- Filme "promocional"
- Neurónio criativo
- MAIOCLARO
- O mata moscas russo
- Na morte de Stella Piteira Santos
- Discografia do essencial (1)
- A verdade é que não tenho sono nenhum
- Equadogue
- A "outra metade" da humanidade
- Com tranquilidade...
- Literatura infantil
- Quem manipula quem ?
- O João faz falta (2)
- Fartos da birra
- Café com Blogues
- The day after
- CRISE
- Ainda há
- Afinal Santana era literato
- O plano de estímulo de Obama deve incluir ciência
- Coração cor-de-rosa das Trevas
- Mandem-me correntes, sff. Estou mais ou menos de f...
- Obamei!
- Santuário Capitólio
- Desemprego sobe na China pela primeira vez em cinc...
- América
- Pronto, já está !!
- Um americano comum
- Regresso a Ganturé
- O humanismo dos interesses
- As discussões no Jugular
- O diabo está nos detalhes
- Rendeu-se à democracia clientelar
- A impunidade da prepotência
- Sem olhos em casa
- Puro Shakespeare na Figueira
- China: A hora dos sociólogos
- Acabou o SEXTA
- Jovem português desaparecido
- Novo Aeroporto de Lisboa
- "A guerra contra Gaza já estava na agenda"
- Economia de circo
- Acho que nunca mais nos sentiremos sós
- O senhor que se segue?
- A teoria da chaleira
- O Mundo Espera
- 30 anos depois, os Xutos ainda são os maiores
- Conhecimento descartável
- Aveiro
- Endividar-se a alta velocidade
- Não há «israelitas» nem «palestinianos»
- Quem responde ?
- Vamos mudá-lo ?
- Divórcio gay
- O Ano do Búfalo
- Futuros tecnológicos e científicos
- Aquecimento Global
- Está a nevar!
- "Somos campeões da Europa"
- Novos blogues (1)
- Quem "cata ventos" colhe tempestades
- Nova versão "La Fida Ninfa"
- A arte e os seus críticos; a ciência e os seus ini...
- Mais anedotas no Telejornal
- Liberdade e insulto
- Enquanto as pessoas andavam entretidas a fazer bal...
- "Afinal o amor pode durar para sempre"
- O melhor e o pior da entrevista
- Nós somos (mesmo) assim ?
- "Se a Europa se cala, que falem os europeus!"
- Pensões mínimas
- O Estatudo
- Where is wallet ?
- Resolução de Ano Novo
- O tempo das partilhas
- Y quiero que me perdonem por este dia los muertos ...
- A frieza
- À procura da nova Dona Branca
-
▼
January
(89)
No comments:
Post a Comment